segunda-feira, 8 de junho de 2009

Crônica: Meus problemas são maiores

Andando pelas ruas de qualquer cidade de médio ou grande porte é impossível que não se notem quantas pessoas cometem pequenos ou grandes atos de falta de educação. Por tais atos, não me refiro ao fato de que as ditas palavrinhas mágicas, como “por favor” e “obrigado”, estejam em franca extinção – o que já é ruim o bastante.

Antes, refiro-me a outros atos mal-educados como: estacionar em fila dupla, estacionar em local proibido, fechar o trânsito, jogar o carro sobre pedestres que atravessam sobre a faixa, etc.

Que me importa se outros querem passar, ou se o pedestre tem a preferência sobre a faixa? – parece ser o pensamento geral.

Um causo exemplifica bem o que digo: certo dia, ao atravessar um cruzamento que dava em uma ponte estreita, tive que jogar o carro para a direita para aguardar um ônibus que atravessava a dita ponte. Parei logo atrás de outro carro, de forma a não fechar o cruzamento. Um amigo do motorista chegou à janela para cumprimentá-lo – e o coletivo atravessando. Quando o mesmo seguiu seu caminho, qual não foi minha surpresa ao ver que o motorista em frente ao meu carro permaneceu, calmamente conversando com seu amigo – enquanto eu era obrigada a ficar parada aguardando. Ao dar marcha ré para conseguir sair dei um toque de atenção na buzina. Ao fazer isto, fui brindada com um olhar por parte do motorista que dizia claramente: que mulher sem paciência!

Vejam, pois, a minha falta de propriedade: a mal-educada sou eu que preciso seguir meu caminho e não quem para o carro para bater papo impedindo o trânsito. É claro que, segundo o ponto de vista do motorista empacado, a questão que ele tinha para debater com seu amigo, o “problema” dele, era maior que o meu. Eu e meus compromissos que aguardássemos sua licença.

Tal acontecimento que, infelizmente, não é uma exceção segundo pude continuar a observar, me levou a refletir sobre o que levaria adultos a agirem de forma tão irrefletida – com pouco caso ou total ignorância – quando estão claramente errados. A conclusão a que pude chegar é que a doença da qual mais padecemos não é o estresse – é sim, a falta de empatia.

A empatia é aquele sentimento que possibilita que você jamais faça a alguém algo que você não gostaria de sofrer, já que você consegue se imaginar no lugar do outro sofrendo as conseqüências de seus próprios atos. Em vez de empatia, o homem e a mulher modernos desenvolveram um novo sentimento ainda sem nome: uma aberração em nível de inferência e compreensão de mundo que dá a certeza inegável de que o seu problema e as suas necessidades são maiores do que o de qualquer outra pessoa – ou seja, não importa a situação, você estará sempre certo, já que jamais conseguirá se ver no lugar da outra pessoa.

Para quê estacionar o carro para conversar o meu assunto importante? – Quem vem atrás que espere, oras! Para quê sinalizar corretamente minhas intenções no trânsito se o que farei é óbvio? Para quê procurar uma vaga se eu vou apenas pegar meu filho na escola? Quem vier atrás pode esperar...

Para o ser humano moderno imaginar que quem está atrás possui compromissos e horários a cumprir, ou que não possui telepatia para adivinhar o pensamento e intenções alheias, ou que não possui filho nenhum para ficar preso em fila dupla na porta de uma escola, é muito: é um exercício hercúleo para quem possui “problemas” tão importantes a serem resolvidos.

Desta forma, na visão do homo sapiens tornou-se sábio entender que empatia é para ser usada quando assisto àquele filme bem triste e me debulho em lágrimas, ou quando me condôo com as criancinhas famintas na África ou no nordeste. Nestas situações, eu compreendo a penúria ou dor – as quais esqueço tão rapidamente quanto o desligar do monitor assim que eu aperto o botão. Mas quando a questão é aplicar a empatia no meu dia-a-dia, meus problemas são os que, de fato, contam.

Esta atitude é a equivalente a falar acaloradamente contra os corruptos em Brasília e, ao mesmo tempo, oferecer uma cervejinha para o guarda “esquecer” a multa.

O pecado, a corrupção e falta de bons modos estão no outro: o inferno é o outro – já dizia alguém. Quanto a mim, tudo posso, já que meus problemas são maiores que os de qualquer outra pessoa.

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