quarta-feira, 10 de junho de 2009

Crônica: Morreremos jovens

Muitas vezes me perguntei se as pessoas estão cientes da passagem do tempo e do que ela significa. Tempo no sentido imediatista e também no amplo. Tempo este da experiência, mas também das rugas, linhas de expressão, marcas na pele que começam a surgir por todo o nosso rosto e corpo – o incrível é pensar que são estas as marcas que mais afetam nossa sociedade egocêntrica e individualista.

Explico-me: o sentido imediato das marcas da passagem do tempo em nosso corpo para aqueles com dificuldade de enxergar além do próprio umbigo soberano é: Precisarei de nova maquiagem ou novo kit de rejuvenescimento. Uma lipo para “curar” as gordurinhas, talvez? Esclareço antes de polemizar: não possuo absolutamente nada contra tratamentos de beleza ou rejuvenescimento – desde que você não se esqueça de manter jovem e cuidar do que vem por dentro também, não apenas da casca.

Já no sentido amplo, todas estas marcas que se acumulam ao longo dos anos significam que nós estamos envelhecendo e que, se tudo der certo, ficaremos idosos dentro de alguns anos. Idosos como aquela senhorinha que demora séculos para atravessar a rua, parando o trânsito e outro século para contar seu troco no ônibus, impedindo a fila.

Sim, ficaremos velhos, cansados e limitados fisicamente e, muitas vezes, intelectualmente. Digo isto como novidade porque a certeza mais intrigante que tenho vem da minha observação das pessoas e suas atitudes. Esta certeza é a de que os seres humanos se esqueceram de que o envelhecimento, por ser um processo natural da vida, acomete a cada um de nós – a você leitor, a mim, ao meu vizinho, amigos e inimigos – a todos.

Sei que não é exercício dos mais agradáveis ter a consciência do próprio fenecimento e exercitá-la – eu mesma odeio pensar no assunto. Em especial, odeio pensar que, junto com a velhice vem a dificuldade de movimentos, carência dos sentidos, dependência (por muito ou pouco tempo até o “canto do cisne”, dependendo da saúde de cada um, mas ela é inevitável).

Entretanto, vejo que apesar de doloroso, este é um exercício necessário: lembrar que seremos velhos um dia, já que as pessoas andam meio esquecidas.

Exemplifico: há alguns anos moro em Conselheiro Lafaiete-MG, cidade de médio porte que fica a cerca de 90km de Belo Horizonte. Pois bem, ao voltar de uma das escolas onde leciono alguns dias atrás, estava parada em um sinal movimentado do centro da cidade. A avenida possui seis pistas e é margeada por uma segunda rua de duas pistas, ou seja, somando-se: oito pistas a serem atravessadas. Ali mesmo, pouco a frente, e sobre a faixa de pedestres vi um policial militar que sinalizava com a mão e trazia pelo braço uma senhorinha encurvada já, com o peso da idade. Estava bem esperta ainda, mas, obviamente, seus passinhos eram curtos. Eles atravessaram as seis pistas da avenida e estavam cruzando meia rua quando o sinal abriu. O policial estendeu o braço com o intuito de deixar mais claro que continuaria a travessia com a senhora. Óbvio! Claro! Alguém imaginaria que os dois ficariam parados no meio da rua com os carros passando de lá e de cá?

Porém, por incrível e absurdo que pareça, mesmo tendo uma velhinha de passinhos curtos e um militar sinalizando com a mão, vários motoristas simplesmente avançaram impedindo a passagem dos dois. O fluxo de carros teria continuado sem que ninguém permitisse a passagem deles se o policial não tivesse se postado abruptamente na frente de um dos carros bloqueando sua passagem e ficando de pé na frente do mesmo para que a segunda pista pudesse ser atravessada pela senhora.

Dantesco? Surreal? Não... Fato corriqueiro para minha máxima tristeza: motoristas acelerando em ambos os lados impedindo a passagem de maneira assustadora. Isto porque ambos, militar e doninha, estavam sobre a faixa de pedestres, no meio da travessia.

Este e outros fatos semelhantes são os que me fizeram crer que as pessoas são, além de filhas de chocadeira, indivíduos que morrerão jovens. É impossível conceber que nenhum daqueles motoristas consiga ver na senhorinha passante sua mãe, pai, avó, avô ou a si mesmo dali a alguns poucos ou muitos anos.

Mas, como já ouvi muitas vezes “velho tem que ficar em casa!”. Pois gostaria de ver se você, ao ficar velho, quererá ficar apenas em casa sendo direito seu movimentar-se livremente. Ainda vivemos em uma democracia e temos como direito assegurado nossa liberdade de ir e vir, pois sim? Afinal, não me lembro de ter lido em lugar algum que tal liberdade é assegurada apenas aos jovens e de movimentos serelepes.

Ao olhar as pessoas e suas ações, apenas consigo concluir que todos anseiem o fim de James Dean.

O que sei é, ao ver a forma como alguns tratam a estas pessoas, apenas consigo articular minha esperança de ensinar valores melhores ao meu filho – torcendo para que ele os aprenda e saiba que se não é pelo fato de que qualquer ser humano deve ser respeitado que ele tratará condignamente os mais velhos, que seja pelo menos, por pensar que ele desejará igual respeito quando suas próprias costas se encurvarem e as cãs cobrirem sua cabeça.

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