quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

O bom e velho Metal à brasileira

Se perguntarmos a bangers brasileiros com relação a nomes de bandas de metal e suas vertentes que seriam referência para eles, quais as possíveis respostas? Muito provavelmente Black Sabbath, Iron Maiden, Megadeth, AC/DC, Led Zeppelin, Exodus… Se a questão envolver nomes de músicos, ouviremos, provavelmente: Ronnie James Dio (Black Sabbath e solo), Joe Satriani, Steve Vai, Geezer Butler (Black Sabbath), Geddy Lee (Rush), Neil Peart (Rush), John Bonham (Led Zeppelin), e a lista continuaria ainda…

É engraçado como as respostas a perguntinhas básicas que envolvem influências, ou seja, as bandas ouvidas pelos apreciadores do estilo, nos mostram como as nossas referências em termos de rock and roll e metal andam carecendo de um pequeno detalhe: nomes próprios. Sendo assim, é impossível que não se questione se tais nomes e influências inexistem em nosso cenário.

Em outras palavras: se o nosso panorama musical resume-se à boa MPB; à dita MPB (aquela de péssima qualidade que envolve uma profusão exuberante de bundas); ao pop rock, excluindo totalmente o rock tradicional e suas vertentes como o heavy, thrash (que não quer dizer lixo como ignorantemente alguns afirmam, e sim mexer-se, revolver-se), death, power, punk, folk.

Se, neste momento, a curiosidade mexeu com seus intestinos e te fez procurar, você vai perceber que, mesmo executando uma busca pouco profunda, essa tese de que sofremos de carência crônica de nomes cai por terra. Ao mero ato de digitar “metal brasileiro” no google abrem-se magicamente dezenas de direcionamentos para links relacionados ao metal e vários deles conduzem a páginas que mencionam nossas bandas de metal.

Pipocam nomes como Dorsal Atlântica, Overdose, Sepultura, Sarcófago, Chakal, Viper, The Mist, Azul Limão, Witchhammer, Holocausto – para mencionar apenas algumas das consideradas precursoras do movimento metal no Brasil.

A excelente Overdose chegou a fazer sucesso mundial nos anos 80/90 – e, uma curiosidade: o primeiro LP deles Século XX (1985) foi lançado em conjunto com o primeiro do Sepultura Bestial Devastation (1985) por motivos financeiros: nenhuma das duas bandas tinha dinheiro para bancar a produção de um Long Play por conta própria. Já são lendárias as histórias de que os fãs de Sepultura arranhavam o lado do Overdose, enquanto os fãs dos últimos faziam o oposto. Segundo consta, eu tenho um dos que escaparam à “ferocidade” da época, ainda orgulhosamente intacto. Quanto ao Chakal, pude presenciar um show deles em 2008 e, na ativa, continuam fiéis ao nome que construíram.

Em relação ao Dorsal, o Dividir e Conquistar (1988) permanece como um marco no metal brasileiro.

Dentre estas bandas, podemos pescar músicos respeitáveis como o Bozó, vocalista do Overdose, cuja foi e é uma das minhas influências, quando canto. Pit Passarell, baixista do Viper, Jairo Guedez (que já marcou presença em três: Sepultura, The Mist, Overdose), Paulinho Caetano (Witchhammer) e muitos outros, em uma lista também longa.

Eles contribuíram e ainda contribuem com o cenário Rock/Metal brasileiro constituindo-se como influência para, pelo menos, duas gerações – chegando à terceira (que inclui pequenos como meu Achilles, que tem nove anos, mas conhece mais de bandas brasileiras do que muitos marmanjos que fazem aquela cara de interrogação quando ele pergunta coisas como: “Você já ouviu Carro Bomba?”).

Estes músicos, “das antigas”, têm seu legado respeitado e vêem a continuidade de seu grande trabalho em bandas mais recentes como Tuatha de Danann (que já se apresentou em Lafaiete com seu folk metal), Krisiun, que produz death metal de respeito internacional desde 1990. Este fato é comprovado pelas excursões em shows próprios e em conjunto com bandas cujos nomes já são clássicos como o Kreator.

Além deles, não se pode esquecer do Concreto, há anos na estrada produzindo o bom e velho rock and roll, com trabalho autoral de qualidade e Cds primorosamente acabados (apesar de que nem todos encaixam-se na definição de metal).

Para mencionar ainda algumas bandas a cujos shows assisti recentemente, deve-se falar de Baranga e Patrulha do Espaço. Esta última, já há anos na estrada, continua com uma pegada forte e um show eletrizante. É só falar neles que eu começo a cantar: “Desce o véu no meio da noite/ Dois olhos brilham na escuridão (...)” – Olho Animal que é, de longe, minha favorita deles.

Então, que elas existem, existem. Que os nomes são de peso, são.

Então, porque estão tão distantes do público aficcionado?

A resposta é simples e triste: não valorizamos devidamente nossa própria produção. É algo como dizer que a grama do vizinho é mais verde e que a mulher dele é mais gostosa. Assim, nossas bandas carecem de apoio e dinheiro o que faz com que se desintegrem deixando, muitas vezes apenas saudades e belas músicas.

Cabe a nós, portanto, fãs do estilo cuidar para que, quando merecedoras dos nossos ouvidos, não deixemos de dar nosso suporte e de tê-las e a seus músicos como nossas referências em conjunto com aqueles outros nomes mencionados no início. Assim, garantiremos que, em acréscimo aos importados, tenhamos sempre o bom e velho metal à brasileira.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Carta ao Jornal "Correio da Cidade"

Publicada em 20/12/2009
Sr. Editor,

Venho demonstrar minha total indignação com relação à propaganda da SINCOL, veiculada há vários meses por vocês ( essa semana presente na Seção Comunidade, página 22). Tal propaganda é inconstitucional já que afirma que "o preço justo" da passagem será apenas alcançado quando "todos" pagarem pelo transporte.

Tal afirmação descuidada é inconstitucional já que posta-se contra direitos garantidos pela lei máxima desse país, reassegurados, por exemplo, pelo Estatuto do Idoso e reafirmados recentemente pelo STF. É de conhecimento geral, portanto, que idosos e deficientes (para estes últimos o direito é garantido pela Lei Municipal 4691/2005) possuem direito à gratuidade no transporte coletivo urbano - que, no caso de Lafaeite possui suas empresas representadas pelo SINCOL. Desta forma, como o SINCOL não ignora, nem todos têm que pagar sua passagem.

Com essa propaganda tendenciosa, tal sindicato, além de demonstrar profundo desrespeito pelas leis que regem esse país, ainda faz uso indevido do poder de comunicação desse veículo respeitado na cidae, para defender posição ilegal - e, mais uma vez reforço: inconstitucional. Como meio formador de opinião e jornal de maior circulação do município, tal propaganda mostra-se altamente prejudicial incentivando o desrespeito aos cidadãos que contam com a proteção do Estado e do município: ou por já terem contribuído sobremaneira através de anos de trabalho ou por possuírem deficiência.

Já é desrespeito suficiente que seja exigido dos idosos que façam carteirinha junto à empresa de coletivos urbanos - já que, legalmente, bastaria que eles apresentassem a carteira de identidade para comprovar sua idade para obter a gratuidade no transporte. Eu mesma já presenciei uma cobradora da empresa Presidente exigindo dinheiro de um senhor de mais de 65 anos, já que sua famigerada carteirinha eletrônica, que apenas possui 6 passagens diárias, estava exaurida. Ele não possuía o dinheiro e ia descer do coletivo quando, obviamente, intervim e expliquei ao senhor que ele deveria apenas mostrar sua identidade e que se qualquer funcionário o quisesse barrar que ele acionasse a polícia.

Realmente, tal propaganda em conjunto com o comportamento da empresa de transportes - executado por seus funcionários como exemplificado - são a gota d'água e servem apenas para demonstrar o quanto é necessário reformar a mente das pessoas que pretendem gerir os serviços públicos prestados á comunidade lafaietense.

Em acréscimo, o CONAR, Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, em seu código, Seção 3, atigo 23, ao falar sobre a honestidade, diz que a propaganda não pode abusar da "falta de experiência ou conhecimento do consumidor" - algo claramente feito pela propaganda do SINCOL, já que sugere com ela que "todos" paguem passagem para benefício da população - quando existe legislação própria que garante o direito de gratuidade no transporte coletivo, para aqueles, merecidamente, protegidos pela lei.

Mesmo uma rápida análise da mencionada propaganda demonstra como, em seu intuito de formar opinião contrária à lei, o SINCOL age de maneira leviana podendo levar áqueles que desconhecem a lei a crer que realmente estão sendo lesados quando alguém que, ao utilizar seu direito, não paga passagem. Ainda no artigo 45 do mesmo código, o órgão responsabiliza igualmente agências e veículos de comunicação que publiquem anúncios que firam quaisquer princípios éticos descritos na normatização insituída pelas próprias agências, já que são elas que sustentam o CONAR, estando então os veículos sujeitos às mesmas punições.

Manifestada minha indignação, aguardo a reavaliação desse respeitado jornal com relação à mencionada propaganda, demonstrando a ética e o respeito ao cidadão que sempe foram características desse semanário.

Atenciosamente,

Érica Araújo e Castro

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Dia da Raça Negra?

No dia 20 de novembro, no Brasil, comemora-se o dia da Consciência Negra. A data foi escolhida para homenagear Zumbi dos Palmares, cujo rosto real jamais conheceremos, mas que destacou-se por comandar o quilombo dos Palmares até sua extinção – um verdadeiro massacre que culminou com a morte do herói que dedicou-se a preservar a liberdade dos seus.

Obviamente, não é apenas em uma determinada data que se devem pensar nos excluídos: seja essa exclusão devida à orientação sexual, sexo, cor, etnia, religião ou quaisquer outras formas de preconceito. Entretanto, quando a data existe, que seja usada para a reflexão, que é exatamente o que proponho que façamos agora.

Para falar de um dia que muitos entendem como sendo de exaltação da raça negra, gostaria de falar primeiramente sobre o conceito de raça.

É preciso esclarecer: discussões sobre raça tem-se dado principalmente sob dois parâmetros – o filosófico/social e o científico. O primeiro é pautado, principalmente, na maneira como pensadores hodiernos enxergam o tema – dentre eles há nomes que vão de Hitler a Malcom X, passando por outros menos relevantes. O que se observa sempre é um pensamento panfletário entre aqueles que querem o entendimento da palavra “raça” como sendo ligado à separação. Ou seja, afirmam “eu e os meus (de minha raça) somos diferentes de você e os seus (de sua raça)”. Segundo estes, os seres humanos dividem-se em raças que são definidas segundo, basicamente, a sua origem étnica e/ou a cor de sua pele.

Tais pensamentos de exclusão – em vez de “todo”, “coesão” – levaram a genocídios como a tentativa de extermínio de judeus durante a Segunda Guerra – onde arianos (brancos alemães) massacraram judeus (brancos, muitos também alemães, mas Da etnia judaica). Levaram também ao genocídio em Ruanda onde africanos da etnia hutu dizimaram famílias inteiras da etnia tutsi, vista como rival – outra vez pessoas que possuíam a mesma cor de pele, dessa vez a preta, digladiaram-se em torno de uma divisão segundo a qual determinada “raça” é mais merecedora de bens, terras, oportunidades. Estes mesmos mencionados pensamentos de separação levaram ainda às crenças pseudo-cientificas como a Eugenia, cuja aplicação no Brasil sugeria um “branqueamento” de nossa sociedade, já que as características do povo branco seriam as melhores.

Como se pode facilmente observar, tais conceitos que preveem a separação de seres-humanos em raças – seja para exaltar uma ou referir-se pejorativamente a outra - não passa de uma suavização das mesmas crenças que levaram aos campos de concentração e ao genocídio.

É por isso, e por fatos que ainda mencionarei, que prefiro me ater à definição científica de Espécie e Sub-espécie (raça). No livro Zoologia (Valdir Fernandes) lê-se que “Espécie é um conjunto de seres semelhantes que, quando cruzados, produzem prole fértil, isto é, descendentes capazes de reproduzir-se”. O livro continua explicando que “os indivíduos de uma espécie são subdivididos em grupos menores, as sub-espécies, raças, ou variedades, que diferem entre si, geralmente, como resultado de uma distribuição geográfica diferente.”

Assim, cientificamente, não existe uma única raça branca, ou preta, ou indígena, ou oriental ou quaisquer outras quando se referem aos homo sapiens, nome científico de nossa espécie. Antes, existem muitas raças de seres-humanos de cor branca, muitas raças de humanos de cor preta, muitas indígenas, muitas orientais e assim por diante. Cientificamente, cada povo separado geograficamente do outro pode desenvolver características diferentes, tornando-se assim uma nova raça.

Inteligentemente percebe-se então que o nosso país, além de receber muitas raças, que em sua maioria eram brancas e pretas, devido às suas dimensões continentais e à cultura da miscigenação que juntou no mesmo caldeirão colonizadores, escravos e nativos, é formado por dezenas, talvez centenas de raças. Vê-se assim, grupos brancos cujas características e localização os tornam uma raça diferente de outros grupos brancos que residem em localidades separadas geograficamente. O mesmo acontece com grupos pretos espalhados. Se tais grupos, sejam brancos ou pretos, estiverem ainda em condições de pouca comunicabilidade, vão-se perceber as diferenças culturais acrescidas às particularidades físicas que, certamente, fariam a felicidade de etnólogos e etnógrafos que se dispusessem a estudá-los.

Quanto à afirmação de que pessoas da cor preta são mais alvo da discriminação social sofrendo de baixa escolaridade e seu consequente sub-emprego ou desemprego ela é verdadeira apenas se se incluírem aí todos os mestiços – dentre os quais eu me incluo, já que devido a minha ascendência possuo características tanto de brancos quanto de pretos e indígenas – que sofrem dos mesmos males. E que aqueles que querem defender sistemas de cotas para os que possuem determinado tom de pele baseando isto em “erros históricos” eu pergunto: como separar, em um povo mestiço, aqueles que descendem ou não de escravos, se, muito possivelmente, a quase totalidade da população – seja ela branca ou preta – descende de ambos: tanto dos que brandiram o chicote quanto dos que foram chicoteados? (É claro que dessa afirmação excluem-se aqueles poucos grupos indígenas ou quilombolas que, devido ao seu isolamento, são fruto de um único ramo genético. Para esses a lei, merecidamente, devido à sua condição especial de acesso restrito ou nulo à educação, já reserva cotas há anos).

E pergunto mais: como explicar aos indivíduos de cores diferentes, que vivem nas mesmas subcondições, expostos à mesma precariedade de educação e subsistência que alguns, por terem pele mais escura, são passíveis de receber subsídio governamental sob forma de bolsa de estudo enquanto outros, por serem de pele clara, não? Mas isso é assunto para ser discutido em crônica futura.

Voltando ao dia da Consciência Negra, seria mesmo necessário que se separasse um dia para que se lembrem feitos de pessoas de pele escura, com o objetivo de ressaltar a cultura advinda dessas raças, originárias da África, fruto de sua mistura com as demais raças presentes no Brasil?

Enquanto alguns afirmam que não – eu digo que SIM. E infelizmente! O fato é que no Brasil não existe apenas o preconceito social – existe a discriminação de cor, sim. (Creio que ficou mais que claro que, sob o ponto de vista de quem defende a definição científica para raça, o preconceito é de cor já que povos de raças diferentes, mas de cor idêntica ou parecida, são objeto do mesmo preconceito).

Digo que infelizmente deve existir porque, apesar de vivermos em uma nação multicor, qualquer desavisado que pegue um livro de história vai achar que pretos e mestiços são a minoria em nossa população – não a maioria. Esse fato, sozinho, demonstra o quão pouco valorizamos as nossas raízes multi-étnicas.

Eu, mestiça, não me reconheço como participante da História de meu próprio país! Não vejo lá todos os meus antepassados representados: apenas uma parte deles. Pretos e mestiços, quando mencionados, o são apenas de passagem e, quando são heróis modernos, tendem a morrer esquecidos como João Cândido Felisberto (que é claro, você sabe quem é – ou não?).

O sonho de Martin Luther King de um mundo onde as pessoas fossem julgadas apenas pelo seu caráter, ainda está longe de se concretizar. Isso ainda é verdade no Brasil, para minha máxima vergonha. Escapa-me o motivo de enxergar de maneira diferente àqueles pertencentes à nossa mesma espécie, fruto do mesmo caldeirão cultural que gerou a todos.

Porém, faz-se necessário que se comentem os chamados movimentos afirmativos ou a maioria dos ligados à dita raça negra. Dita raça porque, como esclarecido, não há uma só raça – qualquer que seja a cor da pessoa que se queira mencionar. (Ainda, é bom lembrar que, devido ao meu desprezo pela separação de seres humanos em raças (sejam as definições ariana, branca, preta, negra ou quaisquer), enxergo apenas uma diferença marcante entre eles – as várias tonalidades de cor da pele).

Tenho acompanhado de perto alguns desses movimentos – perto o suficiente para saber o que fazem, longe o suficiente para não me envolver no preconceito pregado por alguns. Espanta-me como alguns defendem a superioridade da “Raça Negra” – utilizando-se do mesmo preconceito de que foram alvo, só que inverso.

Certa vez, ainda em Belo Horizonte, li no jornal uma entrevista de uma senhora, líder de um desses movimentos, que afirmou categoricamente que não gostava que suas netas namorassem brancos, pois enfraquecia a raça. Não foi essa a afirmativa de Hitler quando quis “limpar” a Alemanha?

E mais, meu marido, em ocasião passada, mestiço como eu e a maior parte da população brasileira – mas que é chamado de branco devido ao tom claro de sua pele – ao trabalhar de segurança em firma de um amigo chegou a ser ignorado por outros, de cor preta, que cumprimentavam-se pegando nas mãos uns dos outros, mas que o saltavam, como se ele não estivesse ali. E mais: o coordenador do grupo chegou a ser questionado do motivo de estar trazendo brancos para trabalhar no meio deles. Como se a lei contra a discriminação, ou o senso ético que despreza qualquer tipo de preconceito funcionassem como via de mão única!

Não é incomum que se vejam pelas ruas camisas com escritos “100% Negro”. Gostaria mesmo de ver o semblante dessa pessoa ao ser confrontada com a mistura genética que, quase certamente, constitui seu DNA. Vi uma entrevista de um africano, Ibrahima Gaye que disse o que eu realmente sinto: que alguns movimentos afirmativos estão criando pessoas híbridas – que não pertencem nem a seu país e nem à África. Que antes de tudo, tais pessoas deveriam enxergar-se como brasileiros.

Chega a ser duro ouvir isto de um estrangeiro: que nossa nação está carecendo de identidade.

Assim, vê-se que é preciso valorizar as nossas raízes multiculturais – faze-la presente em nosso sistema escolar para que os brasileiros de todas as cores sintam-se parte deste país – e se vejam como brasileiros. É ainda preciso proteger aos pobres e àqueles que possuem acesso restrito à educação possibilitando-lhes caminhos que, de outras formas, estariam a eles vedados – mesmo que através de cotas limitadas em universidades e de emprego.

Mas, mais do que isso, é preciso que os brasileiros se enxerguem como iguais – frutos de um mesmo contexto histórico-social, independentemente de qual seja o fenótipo, de qual cor seja a sua pele. Só então seremos, realmente, uma nação.

* Abaixo uma definição de raça, segundo consta no dicionário Priberam (online). Se você não é um boi ou um cavalo, espere que concorde com eles e comigo. Ou que concorde com a Margareth Menezes (cuja voz, realmente, é divina, em entrevista ao Serginho Groismann em seu programa Altas Horas, comentando sobre a forma distorcida que determinados movimentos dogmatizam seus adeptos): “Pertencemos todos è mesma Raça – a humana.”.

raça
s. f.
1. Grupo de indivíduos cujos caracteres! biológicos são constantes e se conservam pela geração: Raça branca, raça amarela, raça negra, raça vermelha. (Os progressos da genética levam hoje a rejeitar qualquer tentativa de classificação racial.) = CLASSE, DESCENDÊNCIA, ESTIRPE, FAMÍLIA, GERAÇÃO, LINHAGEM
2. Subdivisão de uma espécie animal: Raças bovinas.
3. Conjunto de ascendentes e descendentes de uma família, um povo; geração.
4. Conjunto de pessoas da mesma profissão, das mesmas tendências: A raça dos poetas.
5. Fig. Casta; espécie; qualidade; jaez; laia.
6. Reg. Réstia de sol.
7. Mínima quantidade de qualquer coisa.
animal de raça: animal de boa origem.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Sobre a moderna barbárie

Já há alguns dias temos acompanhado os acontecimentos relacionados à presença de uma aluna trajando um vestido curto na Uniban, no campus de São Bernardo do Campo - SP. Na ocasião, ela foi seguida por uma turba, sendo ofendida e, finalmente, teve que ser escoltada pela polícia para fora da instituição.

Posteriormente, a universidade expulsou-a.

E teve a própria decisão revogada por seu reitor após repercussão negativa em todo o país.

A justificativa para a expulsão, a princípio, foi a argumentação de que a mencionada aluna já teria sido advertida de que deveria vestir-se apropriadamente, e que havia se negado a fazê-lo. Além disso, afirmou-se que no dia do tumulto, a aprendiz teria “desfilado” pelas dependências da faculdade, tomando um percurso maior que o usual, fazendo poses, para aqueles que quisessem tirar fotos, exibindo suas partes íntimas – conforme veiculação televisiva que reportava depoimentos de pessoas envolvidas com a universidade em questão.

Esse acontecimento me fez refletir bastante. Como se sabe, estou intimamente envolvida no ambiente educacional e prezo muitíssimo o espírito que deveria estar presente em todas as academias: o respeito ao conhecimento e ao desenvolvimento do mesmo, assim como à liberdade individual – pois, em ambientes em que se cerceiam a liberdade dos indivíduos, corre-se o risco de passar-se a cercear outros aspectos de sua liberdade. (Chame de trauma da ditadura, mas, é assim que realmente penso).

É justamente sobre essa tal liberdade individual que gostaria de discutir – a liberdade individual, aquela que nos permite apreciar, utilizar, ouvir, crer, argumentar, freqüentar, fazer – ou vestir – absolutamente tudo o que “vier na cabeça”. Em países democráticos, à exceção do que acontece em teocracias ou sob regimes totalitários, as pessoas são protegidas até mesmo pela lei, que preserva esse seu direito.

Assim, hipoteticamente, tendo como reserva apenas os limites morais (altamente subjetivos), habituais ou de formalidade – como, por exemplo, os trajes admitidos em fóruns, locais que restringem a vestimenta, impedindo o uso de roupas, não pelo seu cumprimento, mas pela sua solenidade – o cidadão brasileiro poderia trajar-se como bem entende.

Isso pode ser facilmente comprovado por uma observação simples em qualquer avenida de centros de cidades pelo país afora: a profusão de camisetas regatas, vestidos curtos, shorts de pouco mais de um palmo e meio, decotes, camisas de bandas (todos usados por homens e mulheres – inclusive os vestidos!).

Enfim, gente que se veste de acordo com meus padrões, com padrões diferentes dos que eu julgaria apropriados – mas, o que fica claro é que a minha opinião diz respeito apenas ao que eu visto. E nada mais.

Afinal, até onde me consta, não contribuo financeiramente para manter o guarda-roupas de ninguém – então, não tenho nada com isso!

Com relação ao ambiente escolar, em escolas de ensino médio, a vestimenta costuma ser limitada pelo Regimento Escolar – habitualmente, em nosso país, costuma-se exigir o uniforme.

Na academia, no ambiente universitário, porém, tais limitações, normalmente, inexistem. Os trajes não são, muitas vezes, sequer mencionados no Regimento.

Mesmo quando o são, são referidos através de conceitos vagos e absolutamente adaptáveis pela opinião individual como “de acordo com a moral”, “respeitando os costumes”.

Aqui, voltamos ao caso da Uniban. Para isso, convém acrescentar que não estou discutindo nem o caráter da moça, nem sua moral – os quais desconheço - ou qualquer coisa que os valha. Discuto, apenas, o acontecimento envolvendo sua minissaia e a turba de perseguidores.

Sejamos sinceros: algum de meus leitores, residente no Brasil, pode realmente afirmar que jamais tenha visto vestido, do comprimento usado pela aluna brasiliense, pelas ruas, bancos, lojas, bares, repartições públicas e, até mesmo universidades? Segundo o que eu mesma vejo dando um passeio pela cidade onde resido, posso afiançar que já vi até mais curtos!

Quanto à afirmação da direção da universidade de que ela tivesse exibido as partes íntimas em poses sensuais, e por isso havia sido expulsa, ora, efetuei busca rápida pela internet pelos vídeos ou possíveis fotos. Encontrei vários que mostravam a turba perseguindo a moça, mas absolutamente nenhum em que se pudesse vê-la mostrando nádegas, seios ou pélvis. Na maior parte deles ela aparece ora com raiva, ora com medo – mas sempre constrangida, e em alguns até mesmo chorando.

O fato de que as tais fotos não estejam na rede não soa estranho, especialmente considerando-se a profusão de celulares apontados para ela por inúmeras pessoas, participantes da turba ou meras expectadoras do acontecido?

E não queira o amigo afirmar que aqueles que teriam tirado as supostas fotos as teriam preservado para si, ou teriam evitado, por pudor ou medo, publicá-las na internet! Soaria absurdo considerando-se o contexto tecnológico, de informação e de exposição em que vivemos, agregado ao anonimato que a rede mundial de computadores provê.

Ainda me lembro quando eu mesma cursava faculdade, de uma de minhas colegas de classe absolutamente adepta das minissaias. Ela as usava em todos os estilos possíveis, todas as cores – mas o comprimento sempre o mesmo: curtinho mostrando suas pernocas. Tento imaginar nossos colegas formando um movimento, como o visto na Uniban, contra as sainhas da menina – e, sinceramente, por mais que eu tente, sempre me parece algo que não aconteceria dentro de uma academia de país democrático.

Especialmente do Brasil onde a exposição do corpo é o lugar comum – e não a exceção. Aqui, mulheres nuas vendem até pneus, já que seus corpos são exibidos em propagandas destes produtos. Se se falar de cerveja, então... Desta forma, fazer de uma minissaia motivo de notícia seria nada menos do que hipocrisia.

Bem me lembro que quando eu vi a primeira reportagem sobre o assunto, fiquei com a sensação de que algo estava faltando ao enredo, uma explicação mais racional para atitude tão irracional. Depois, conclui que aquela turba agia como sempre imaginei que acontecesse na caça às bruxas – alguém grita “Bruxa!”, a notícia corre de boca em boca crescendo em detalhes e eventos a cada repetição inexata e, a população em frenesi e histeria, persegue e apedreja a mulher.

Certo estava aquele que afirmou que a “massa é burra”.

O espantoso é que continue burra mesmo dentro da academia, onde o saber e o conhecimento deveriam imperar.

Se não imperam, que reine, pelo menos, o bom senso. E que atire o primeiro flash quem for hipócrita o suficiente.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Sobre professores exauridos e alunos rebeldes

(Desculpando-me por minha ausência, volto a postar. Professores ficam, realmente, assoberbados no final do ano!)

Recentemente escrevi sobre o caso da professora que perdeu seu emprego ao dançar em um show de axé, exibindo seu corpo de maneira pouco apropriada a um educador.

Hoje, continuo escrevendo sobre o mesmo assunto: o professor – todos sabem tratar-se de assunto de minha predileção, já que sou, eu mesma, educadora há anos.

Assim, como tal, me assusto quando abro os jornais ou ligo a televisão e me deparo com manchetes que destacam o desgaste que tem se tornado comum na relação aluno-professor, ou na maneira como o próprio professor encara seu papel, ou na forma como o aluno encara ser correto portar-se e tratar seu professor.

Susto grande tomei quando vi matéria no jornal do SBT que mostrava uma gravação feita por alunos, em uma sala, utilizando-se de seus celulares, ao longo do qual um professor mostrava-se desgastado, exaurido. Ele também evidenciava por sua fala o quão desesperado estava ao não conseguir lidar com o mau comportamento de seus alunos.

Ao longo do mencionado registro, o professor ofende frontalmente, com palavreado baixo, seus alunos, assim como os pais deles, expondo tripas sociais intelectualmente discutidas – e, por vezes, ocultas por pseudo-técnicas ou estratégias de avanço de ciclos – mas, para as quais, ainda está-se longe de se encontrar solução: as relações de pais-filhos/alunos-professores-diretores/escola.

No decorrer da matéria, alguns dos alunos da sala ofendida foram entrevistados e reconheceram, exibindo feições irônicas de debochadas, que a sala composta por eles é desordeira, desorganizada e desrespeitosa. E que o professor havia apenas reagido furiosamente após várias tentativas frustradas de obter silêncio.

Ficou ainda implícito que ou os professores agiam assim e conseguiam algum silêncio, ou ignoravam completamente o comportamento inapropriado dos aprendizes e passavam a simular dar aula, cumprindo o conteúdo, ministrando-o para as paredes (as únicas realmente silenciosas).

Era uma situação limite – onde todos os envolvidos agiram no limite: da educação e da paciência.

Assim, é impossível deixar de perguntar: quem estava certo? O professor-esbravejador? Seus alunos malcriados, que gravaram os gritos de desabafo?

Afirmo que, nessa situação, todos estavam certos.

E também errados.

E que, na verdade, a discussão para se chegar a essa conclusão é muito mais profunda e remete a questões muito maiores do que a um acontecimento de poucos minutos.

Primeiramente, é preciso que se diga que é muito mais cômodo para um professor, naquela situação, fingir que dá aula ignorando a baderna da sala. Isso não altera seu salário. Isso não altera seus resultados – já que quem elabora as provas é ele, que pode fazê-las com consulta ou, no ápice da falta de ética, dando as respostas para os alunos (como eu já vi acontecer diversas vezes, em várias escolas). Números falsos serão gerados já que as notas não refletirão a aquisição de conhecimento da sala – mas, é fácil fazê-lo e o professor sai absolutamente impune. E a sala, feliz.

Desta forma, meu leitor há que concordar: o professor estava certo e agindo de acordo com o que se espera dele ao exigir silêncio e disciplina.

O erro estava na forma. Na maneira como ele o fez.

É inadmissível que um professor – profissional preparado, no mínimo, graduado, adulto – comporte-se exatamente como seus alunos adolescentes.

Onde estaria o modelo, o padrão? De que forma se pode exigir respeito se não se oferece primeiro o mesmo respeito que se exige?

Aqui, entretanto, faço uma pausa para algumas perguntas para reflexão: estaria a direção ciente da postura indisciplinada da turma e, estando ciente, teriam sido tomadas atitudes para evitar que se chegasse à tal situação limite? E os pais? Estariam informados e, como atuantes na educação dos seus filhos, tomaram providências para garantir que seus filhos passassem a comportar-se bem? E quanto aos alunos: foi feito algum trabalho motivacional e educacional (no sentido de normas de educação e comportamento mesmo) com a turma? Se foi, quais os limites impostos e quais as punições que seriam aplicadas (tendo como base o regimento da escola)?

E mais, foram mesmo aplicadas quaisquer punições?

Considerando-se minha experiência como docente há 16 anos, em várias escolas - particulares e públicas - assim como atuando como pesquisadora de técnicas de ensino, creio que, confrontada com o demonstrado na reportagem televisiva (situação da sala, exasperação do professor, comportamento dos alunos) posso responder, tranquilamente, NÃO a absolutamente todas as perguntas feitas.

Não, não e não.

Infelizmente, pais não participam da educação de seus filhos e delegam à escola a tarefa de ensinar-lhes coisas tão básicas quanto falar “por favor” ou “muito obrigado”. A escola, ainda moldada aos tempos em que ao menos a educação comportamental era dada pelos genitores aos filhos, simplesmente não tem demonstrado ter condições de lidar com os adolescentes sem a menor noção do que é conviver com outros em um grupo e mais, demonstrar respeito por uma figura de autoridade – no caso o professor.

Assim, digo que um conjunto de pais e direção omissos leva às situações que, o professor sozinho, não é capaz de lidar. Ele, por sentir-se incapaz, toma atitudes questionáveis, que não condizem com sua preparação para a sala de aula.

Mas, como silenciar uma sala de alunos que não sabem comportar-se e que têm a certeza absoluta de que nada de mais sofrerão pelo mau comportamento?

Ainda pior: não raras vezes já vi pais que, ao serem confrontados com as péssimas atitudes de seus filhos no ambiente escolar por diretores e coordenadores, ativos e comprometidos com suas funções, em um jogo de disfarces e hipocrisia, culpam a escola por não educá-los, cobrindo seus pobres rebentos aviltados e mal comportados de lambidas!

Como bem disse uma professora experiente, minha amiga: esses não são os filhos rebeldes. São piores, pois já são os filhos dos filhos rebeldes.

Vê-se, então que professor estava certo e, ao mesmo tempo, errado.

Falemos agora dos alunos.

Estariam corretos ao gravar os xingamentos do professor em seu momento de explosão?

Sim! Claro que sim!

De outra forma, seria a palavra deles, uma turma já reconhecidamente difícil, contra a palavra do professor – o qual não posso afirmar que reconhecesse o que havia feito (nem negar, obviamente, já que não o conheço).

Mas o fato é que o erro deles não foi o fato de terem registrado – mas sim o fato de terem causado a situação com seu mau comportamento.

Mais uma vez, não defendo o comportamento descontrolado do professor – recrimino-o severamente. Para se assumir qualquer função, tem-se que estar preparado para o que se vai fazer: o que, no caso do educador, inclui enfrentar essas possíveis situações em sala de aula.

Porém, tem-se que lembrar o óbvio - professores são seres humanos sujeitos aos sentimentos humanos: raiva, angústia, frustração e destempero. Assim, ao passo que os alunos estavam certos ao fazer o registro da afronta, estavam errados ao levar o professor ao limite, ao ponto de fazer o que não gostaria.

Eu mesma já me vi em pouquíssimas situações (Graças e Deus!) em que algum aluno conseguiu me irritar sobremaneira – o que contou para o controle dos meus impulsos foi o fato de que, ciente de meu papel qual educadora e de que posso servir de modelo para alguns deles, não me deixei dominar pelos instintos e a vontade de xingar ou debater.

Como profissional e, mais, como adulta – portanto, com mais experiência de vida – fui capaz de contornar as situações nas quais fui envolvida – obviamente exigindo as punições cabíveis a cada caso, sendo essa a atitude apropriada. Mas, sou humana e passível de erro – por isso, não consigo deixar de me sensibilizar com a situação em que o professor do caso mencionado se deixou envolver.

Assim, viu-se que todos os envolvidos estavam certos, mas também errados.

O fato é que, não se pode deixar de dizer, que essa situação reflete não um destempero de minutos, mas uma situação comum que, fruto de uma dificuldade social muito maior, envolve, primeiramente, a educação e criação de crianças e jovens por seus pais.

Indo além, ainda envolve as atitudes que a escola, essa instituição tão tradicionalista, deve tomar para que possa sair do passado e encarar de frente a complementação da educação das crianças e jovens de hoje, que, muitas vezes, não receberam em casa os limites necessários para a boa convivência com quem quer que seja, trazendo péssimos hábitos para dentro de sala.

Mas, esses são os nossos jovens, oras! É com eles que devemos aprender a lidar – dando os limites necessários, mantendo as emoções sob controle.

(Sei que alguns teóricos vão afirmar que eu disse barbaridades: e teorizarão horrores com relação ao que fazer ou não. Mas o que eu queria mesmo é que esses tais teóricos fossem para a.... sala de aula! E, de preferência, que dessem aula para uma sala bem difícil e mal comportada sendo obrigados a aplicar apenas suas próprias teorias... Seria bem divertido... É... eu acho que eu também tenho um lado malvado...)

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Heavy Metal in my ears is all I ever want to hear! (1)

A frase em inglês que dá titulo a este artigo foi escrita por Mark “Shark” Shelton, um simpático senhor americano, que desde os anos 70 e, ainda hoje, lidera uma das bandas precursoras do som agressivo que hoje caracteriza o heavy metal e algumas de suas vertentes. A banda em questão é o Manilla Road, que conta hoje com mais de 30 anos de história.

Esta mesma frase ainda, poderia ser considerada a epítome do sentimento dos aficionados a este estilo musical – afinal, nestes anos me embrenhando pelos diversos estilos musicais e observando os interessados em cada um deles nunca encontrei mais ardorosos do que os seguidores do heavy metal. São, de fato, fãs xiitas, no pleno sentido do termo, não raro adotando a postura de Joey DeMaio (baixista da banda Manowar) que incansavelmente defende o True Metal.

O Manilla Road, apesar do pouco sucesso que faz por aqui, mostrou ao longo destes anos que, se de fato existe algo chamado Metal Verdadeiro, ele está bem representado em seu som. Houve variação no número de componentes (sempre entre três e cinco), entretanto, Shelton conseguiu manter as características do som ao longo dos anos: a guitarra com riffs pesados, algumas vezes, semi-ocultos pela bateria absolutamente marcante caracterizada pelo uso intenso dos pratos e chimbal, com viradas que se sucedem feitas com maestria de forma a não se tornarem repetitivas nem tornar o som cansativo. Ótimo exemplo disto está no álbum Open the Gates (1985), de cuja música Heavy Metal to the World tirei a frase usada acima. É neste álbum que também está uma das minhas prediletas deles: Astronomica, música que fala da capacidade humana de reverenciar o divino, seja qual for a representação escolhida. Ela foi baseada na obra homônima de Marcus Manilius (poeta e astrólogo romano). Observa-se neste álbum ainda, uma bateria mais pesada que no Crystal Logic (1983), já que houve a substituição de Rick Fisher (um baterista mais veloz) por Randy Foxe que imprimiu mais peso ao som da banda.

O tema do divino é muitas vezes abordado nas letras do Manilla. Isto é acertadamente atribuído ao fato de que o principal letrista da banda, o perene “Shark” Shelton, é extremamente interessado nesses assuntos, tendo, até mesmo estudado antropologia.

Desta forma, o som da banda está envolto em misticismo e lenda versando sobre temas como a corte do Rei Arthur, Atlântida, bruxaria, sempre mostrado predileção por temáticas bretã, celta e nórdica.

Hoje a banda renovada, mas ainda fiel ao True Metal e à temática mencionada, continua lançando obras que valem a pena serem adquiridas e ouvidas como o Spiral Castle (2002) e o Gates of Fire (2005).

Assim, o Manilla Road comprova, junto a outros grandes nomes como AC/DC e Manowar que é, sim, possível se manter fiel a um estilo, mesmo após décadas, sem cair no marasmo e na chatice.

(1) Tradução Livre: Heavy Metal é tudo o que quero ouvir!

Joana D’Arc de Mark Twain??

Publicado no jornal Conhece-te a ti mesmo, edição de Out./09

Foi esta a pergunta que me fiz ao me deparar com o livro sobre o qual prosearemos este mês, na prateleira de um dos supermercados de Conselheiro Lafaiete.

Já conhecia Mark Twain, o pseudônimo mais famoso de Samuel Langhorne Clemens (1835-1910), um dos escritores americanos modernos mais respeitados. Já li várias de suas obras: contos, livros. Neles, o que há de sempre presente é sua veia humorística, extremamente crítica – e por vezes imoral: ele usou seu grande talento para denunciar a escravidão, por exemplo, além de retratar pitorescamente a realidade das pessoas comuns reproduzindo seus diálogos e seu modo de vida, ou para questionar a importância da religião ou para exaltar, por exemplo, os prazeres do onanismo.

Devido ao teor altamente explosivo de alguns de seus escritos, sua família evitou a publicação de vários deles, que apenas vieram à luz décadas depois de sua morte. Suas histórias e personagens mais famosos orbitam ao redor do rio Mississipi e do modo de viver dos barqueiros – profissão que ele mesmo exerceu em uma parte de sua vida e de onde, segundo ele mesmo, retirou seu Mark Twain. Este seria um grito dos condutores de barcos que significaria que havia profundidade suficiente para navegação em determinado trecho do rio. Tal explicação dada por Clemens é questionada – e dada a sua fértil imaginação, não seria de se assustar se se comprovasse que é fictícia. O assunto, portanto, permanece inconcluso.

É deste universo social permeado de humor, ironia, sagacidade e também da maldade humana é que surge um livro absolutamente inesperado como Joana D’arc: Reminiscências pessoais de Joana D’Arc pelo Senhor Louis de Conte (seu pajem e secretário), subtítulo esse que faz referência ao fato ficcional de que o próprio auxiliar de Joana D’Arc teria desenvolvido este relato. O livro foi escrito em 1896.

Para ainda mais ressaltar a verossimilhança, Twain acrescenta ainda a figura de uma terceira pessoa: o tradutor – pessoa ficcional – que teria traduzido do francês arcaico a crônica histórica de Louis de Conte, que por sua vez a escrevera quando já idoso.

A narrativa pelo olhar de Conte, feita por Twain, tornou a história quase palpável – mesmo nas partes onde a menina conversa com anjos.

O livro é dividido em três partes: I) Em Domrémy; II) Na corte e no Campo de Batalha e III) Julgamento e Martírio.

Na primeira parte conhecemos Joana ainda criança, crente em Jesus e nas fadas com a mesma intensidade. É dito no livro que as crianças do vilarejo de Domrémy são, desde sempre, protegidas por suas amigas fadas que são banidas por um grande engano. Conhece-se ainda a maneira como Joana desenvolve sua enorme habilidade oratória que a levou a grandes vitórias e conquistas.

Aqui, devo confessar que a doçura intensa da figura da menina chegou a causar-me certa repugnância – como se a mente recusasse a existência de alguém tão puro conforme ela foi descrita por seu amigo. Mas, há que se lembrar que a tessitura do texto de Twain tem como base a “produção” de um cronista medieval, o qual nutria grande admiração pela personagem tema, o que bem justifica o tom dulcíssimo da primeira parte da narrativa.

Na segunda parte a personagem transforma-se: de criança inteligente a adolescente decidida e convencida de suas obrigações divinas – o que leva até mesmo às pessoas mais improváveis a ajudá-la. O poder de sua oratória tão bem desenvolvido ao longo de sua infância é impressionante, apesar de que ela jamais frequentara escolas ou fora sequer ensinada a ler – daí a necessidade de ter um secretário pessoal de absoluta confiança que escreveria todas as suas cartas. Esse era na história, obviamente, o papel de Conte.

Aqui há, ainda, passagens pitorescas que me levaram às gargalhadas como quando o tio de Joana descreve um acontecimento em que, ao adormecer no campo, esperando a hora para um velório, decide montar em um touro que, acidentalmente derruba uma colméia causando grande confusão no enterro.

Outras ainda lhe conduzem a um sentimento primordial de amor ao seu lugar, aos seus, à sua pátria como quando é descrita a tomada da bastilha de St. Loup: a forma como Joana o faz, na narrativa, sempre conduzindo seus soldados pela força de suas palavras e pela simbologia de seus atos é, de fato, emocionante. É-se capaz de sentir a fumaça dos canhões e o vento no rosto ao cavalgar-se sobre as palavras de Twain para dentro do campo de batalha ao lado da heroína francesa.

É aqui ainda, nesta parte do livro, que Joana deixa de ser uma pessoa e passa a ser a pátria – ela é a França e assim é vista pelos seus e como tal é defendida por seus soldados.

A terceira parte conta de seu julgamento pelo bispo de Beauvais Pierre Cauchon – posteriormente decretado herege pela Igreja por ter condenado à morte na fogueira uma inocente em troca de cargo e poder (oferecidos pelo governo inglês). É uma parte pesada e emocionalmente desgastante já que o narrador põe seus próprios sentimentos de expectativa de salvação que, sabe-se, são frustrados ao fim.

A narrativa é linear, a exemplo das produções medievais – Twain mostrou-se impecável emulando as características dos primeiros historiadores.

Twain, que admirava a Joana D’Arc histórica desde que um fragmento de sua história caiu em suas mãos quando ele era ainda adolescente, coloca-se sem intermediários – secretário ou tradutor - no apêndice, assinado por ele, onde ele esclarece alguns dos acontecimentos posteriores ao martírio da Donzela, como, por exemplo, seu julgamento de reabilitação, aberto vinte e cinco anos após sua queima como bruxa e herege.

O autor mescla ficção e história – sua pesquisa para a construção deste texto durou mais de uma década, o que lhe dá forte embasamento histórico. Sendo assim, é-se conquistado pela figura fictícia/histórica desta adolescente que, aos dezessete anos de idade, sem possuir escolaridade em nenhum nível, torna-se a comandante máxima do Exército Francês, conduzindo-o à reconquista da França que jazia sob o controle inglês por décadas.

E mais, tornou-se santa: ela foi canonizada em 1920, dez anos após a morte do escritor americano.

Assim, conhecemos Joana D’Arc - pelo olhar de Mark Twain – alguém histórico, cuja vida pode ser lida nos processos em que foi envolvida – mas que certamente, está além de qualquer explicação racional.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

O Professor e sua representação social

Leciono há dezesseis anos – iniciei-me no magistério aos 15 anos, ensinando primeiro a meus amigos e, pouco a pouco, chegando à sala de aula.

Dou aula em cursos livres de inglês em Conselheiro Lafaiete além de lecionar em escola regular – do nono ano do ensino fundamental ao segundo ano do ensino médio. Sendo assim, como professora, tenho um leque amplo de alunos que vão desde crianças de sete anos a adultos.

Assim, comprovo no meu dia-a-dia algo que aprendi ainda adolescente, como aluna do CMBH (Colégio Municipal de Belo Horizonte): professores são modelos de comportamento para seus alunos. Podem ser modelos do que eles querem ser, ou exatamente do oposto – dependendo da afinidade que desenvolvem com seus pupilos.

Falando de meu antigo colégio, é impossível não recordar que a disciplina lá era bem diferente da encontrada na escola estadual de onde eu vinha. Exemplifico: tínhamos até mesmo que levantar a calça para mostrar a meia branca ao entrar na escola, tal o rigor com relação ao nosso comportamento e a tudo o mais.

Nós, alunos, encarávamos a disciplina rigorosa com naturalidade – reclamávamos, é claro, mas cumpríamos tudo o que era esperado de nós, já que a escola onde estudávamos era referência na rede Municipal tendo até mesmo prova para admissão e fila de excedentes. Em compensação, vários de seus alunos eram aprovados nos vestibulares quando chegavam ao terceiro ano do Ensino Médio.

Enquanto ainda estudava no CMBH iniciei minha carreira de professora. Eu era uma das monitoras que ajudava aos alunos com dificuldade, além de gerar renda dando aulas particulares. Assim, muito cedo, minha visão foi ampliada – além de ver os acontecimentos pela perspectiva do aluno, ainda os via pela perspectiva do professor.

Como aluna, eu admirava os grandes professores que tinha e queria ser igual a eles. Aristides (Matemática), Tânia Moreira (História), Viola (Química), Regina (Português), Beatriz Reis e Jane (Inglês) – eram professores maravilhosos cuja maneira clara, objetiva de ensinar facilitava nosso aprendizado. Suas aulas não eram absolutamente silenciosas. Mas também não eram barulhentas, nem desorganizadas – participávamos, opinávamos. Quando nos excedíamos, eles nos chamavam a atenção, sem nos desrespeitar e obtinham a ordem necessária para o desenvolvimento da aula.

Havia ainda o SOE (Serviço de Orientação Educacional) – pavor dos que possuíam pais rigorosos, já que uma chamada ao SOE equivalia à chamada dos pais para uma “Reuniãozinha” – que culminava no tradicional puxão de orelhas em casa.

Mas eu também execrava os professores muito tradicionalistas que não nos respeitavam, ou que não explicavam direito, ou que pensavam que não tínhamos o direito de questionar ou reclamar – como alunos deveríamos apenas obedecer.

Como professora e como pessoa, tentava me espelhar nos educadores que eu admirava emulando as técnicas usadas por eles. Durante as aulas de monitoria, eu percebia que muitos realmente tentavam entender, mas tinham dificuldades complicadas para serem vencidas apenas com as aulas em sala. Ao mesmo tempo, cansei-me de esperar por alguns dos malandros que agendavam aulas de monitoria para dar uma satisfação aos pais e coordenadores e jamais apareciam. E mais, me estressava com os colegas que, simplesmente esqueciam-se da hora de fazer silêncio – com o afrouxamento das regras que aconteceu aos poucos ao longo dos anos em que lá estudei, eles sabiam que nada aconteceria a eles, então, não se davam ao trabalho de prestar atenção.

Mudei-me para outra cidade, mas continuei muito perto do magistério já que, como sempre havia dito, tornei-me realmente professora fazendo desta minha profissão. E, sempre acreditei no que o Aristides e a Tânia diziam: o professor é um modelo e deve saber também se comportar – tanto em sala quanto fora dela. Digo também porque muitos acreditam falsamente que apenas alunos devem seguir normas de comportamento – o que é falso – elas existem para todos, como eu bem pude aprender lá no CMBH e sempre procurei aplicar em minha vida profissional e pessoal.

Recentemente, essa minha maneira de pensar – de que professores devem ser cautelosos com sua maneira de agir, já que são modelos para seus alunos, especialmente se são admirados por eles – veio à tona quando acompanhei pela TV alguns fatos que me chamaram a atenção. Dentre eles um destacou-se: o de uma professora do primário que, em show de Axé teve sua saia levantada no palco e continuou dançando e rebolando sensualmente arrebitando suas nádegas, enquanto o cantor puxava, com os dedos, sua calcinha para cima.

Esclareço: quanto a ela gostar de Axé, freqüentar shows, dançar – isto jamais consideraria problema. Cada qual escolhe a diversão que mais lhe convém.

Mas o fato de alguém que é um exemplo para seus alunos sentir-se confortável o suficiente com a exposição de seu corpo de maneira inapropriada, em poses sensuais, em público é muito grave. Denota que, em algum momento na formação dessa professora houve uma falha quando lhe foi demonstrado qual seria seu papel, enquanto ministradora de conhecimento, de valores sociais.

Um professor é também um educador – alguém que, mais do que apenas conteúdo, representa os tais valores sociais e éticos. Além disso, ele leva o nome da escola onde leciona – escolas devem ser ambientes respeitáveis onde imperam o zelo pelo conhecimento e o aprendizado para o excelente convívio social, já que está diretamente ligada à formação de seres humanos: de seu caráter, de sua maneira de pensar.

Consequentemente, como se pode pensar ser possível ser-se professor e expor-se daquela maneira?

Imagine a situação: pais e mães explicam à suas filhas e filhos pequenos que o corpo deve ser preservado e não deve ser exposto frente a estranhos. Explicam-lhes que estes estranhos não estão autorizados a tocar neles, especialmente em suas partes íntimas – que, na verdade, ninguém está. Esta é uma preocupação freqüente dos pais – especialmente em épocas de inúmeros casos de pedofilia.

Depois de toda esta orientação, os filhinhos e filhinhas chegam à escola onde lhes são ensinados os mesmos princípios.

Como eles reagiriam ao se deparar com imagens da professora, que muitas vezes é admirada, de quem eles gostam e respeitam, dançando e fazendo exatamente o que eles foram ensinados a não fazer?

Se você pensar que crianças de 9 ou 10 anos não têm acesso à internet, não seja iludido: se eles não acessam a rede de sua casa, certamente o fazem da escola, da casa dos amigos, do curso de inglês – e ao saber da divulgação no youtube, com certeza procurariam e assistiriam aos vídeos. E uma possível pergunta a surgir na mente daqueles que acham as regras paternas uma “chatice” – e cujos hormônios estão aflorados: se a professora pode, porque eu não?

Naquele período de transição da infância para a adolescência e ao longo da mesma, os pais, por mais bem intencionados e corretos que sejam, não são mais os modelos prioritários de seus filhos. Nesse período, eles emulam o comportamento de outros colegas da mesma idade, outros conhecidos pouco mais velhos e, segundo pesquisas utilizadas até mesmo em programas públicos como o PROERD (programa da Polícia Militar mineira que previne o uso de drogas entre crianças e adolescentes), seus professores.

Mas não aquele professor chato, antipático e antipatizado que destrata seus alunos. Antes, reproduzem o comportamento daqueles que eles têm em boa conta, com os quais tenham o que chamam de “sintonia”, já que se sentem compreendidos por eles.

E isto é ótimo!

E péssimo também. Explico-me: ao passo que certamente esta é uma oportunidade para os alunos entrarem em contato com maneiras de pensar e comportamento diversos daqueles a que estão familiarizados em casa, tornando-os mais culturalmente enriquecidos, pode também se mostrar um perigo se esse professor não mantiver determinados princípios e uma postura adequada ao cargo que possui. Porque, se, por exemplo, um engenheiro(a) autônomo(a) tivesse o comportamento demonstrado por aquela professora, seria, no máximo, ridicularizado aos olhos de alguns, ignorado por outros. O dano que causaria seria à sua própria imagem.

Mas, se alguém que serve de modelo, ou que representa os valores sociais que prezamos como um padre, um pastor, um pedagogo, um médico, um bombeiro – ou um professor – tomam aquelas mesmas atitudes, considerando-se que eles ou estão intimamente ligados ao desenvolvimento intelectual dos jovens ou representam valores sociais como a caridade, o auxílio ao próximo, etc., ele causa dano maior – não apenas a si. Ele espanta a toda a sociedade, já que a mesma entende que suas melhores características são representadas no exercício destas (e de outras) profissões relacionadas.

É claro que professores não são e nem devem tentar ser perfeitos – isto apenas os frustraria já que a perfeição caminha longe da humanidade. Mas, eles devem ter consciência do que representam tanto para a sociedade como um todo quanto para cada um de seus alunos enxergando assim com clareza seu papel de educador e de possível modelo para gerações ainda em desenvolvimento ético e moral.

E, se você pensa que não, que a tal professora não estava exercendo sua profissão, por isso poderia comportar-se como bem entendesse, imagine-se pai ou mãe de uma criança – e ajude a aumentar as estatísticas do vídeo no youtube. Depois de assisti-lo, responda a verdade: você permitiria que aquela pessoa desse aulas para seu pequeno?

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Onde é mesmo Honduras?

Já há alguns dias todos temos acompanhado o desenrolar de um Golpe de Estado aplicado em Honduras, onde uma cria de Hugo Chávez tentava iniciar um processo, que entendidos afirmavam, levaria à centralização de poder nas mãos do Executivo, na figura do presidente Zelaya.

É claro que passamos a nos sentir mais confortáveis depois de recorrer ao Google Earth para ver onde fica Honduras. Quando muito, supunhamos que este país ficava na América. Posso até apostar que alguns chutariam África (é o normal – se você não tem certeza de onde fica um país, há boas chances de acerto ao se chutar o nome de um continente enorme dividido em vários países).

Hoje, de tanto ouvir notícias sobre o lugar, e, é claro, ver os mapinhas insistentemente mostrados nos telejornais quando tocam no assunto, sabemos que fica na América Central.

É. Ali mesmo. No meio daquele monte de Estadinhos Independentes, dos quais raramente nos lembramos da existência, e que são, muitas vezes englobados juntos com a América do Sul em um conjunto chamado América Latina.

Mas o fato é que o governo que assumiu o poder após colocar Zelaya, de pijamas, no avião fazendo-o de presidente-pacote, sofreu pressão da comunidade internacional desde o início, mesmo que estivesse tentando evitar que o país sofresse as agruras de uma Venezuela ou de uma Argentina – cujos presidentes democraticamente eleitos ou arrumaram um jeito de perpetuar-se no poder ou faliram o país com medidas populistas ou ambos. (A lista poderia ser bem maior, mas os dois maus exemplos bastam).

Aqui, a comunidade internacional viu-se em uma sinuca de bico: tinha de defender Zelaya, mesmo que ele se espelhasse em Hugo Chávez, conhecido humorista internacional afamado por suas medidas hilárias (para quem não é venezuelano, é claro) presidente que qualquer povo de juízo detestaria ter, porque a Direita – que é oposição em Honduras, como no Brasil – em vez de recorrer à dispositivos legais (por medo do resultado, eu suponho), preferiu embrulhar o presidente e despachar por sedex para outro país.

Ou seja, defendia-se o “bolivariano” porque se se apoiasse um Golpe, dentre as conseqüências possíveis estaria o pipocar de outros Golpes em outros países da América menos ajuizada numa sucessão de manobras políticas que poderiam levar à instabilidade Estados já não muito estáveis. Quem não faltou às aulas de História sabe que o risco era real – e que, mesmo hoje, pisam-se em ovos com relação a quais atitudes são as menos erradas – porque chegou-se ao ponto em que para qualquer coisa que se faça, há uma possível ocorrência de eventos desagradáveis.

Mas, verdade verdadeiríssima é que eu sinto saudades da época em que o Brasil podia ser citado como referência mundial em diplomacia: épocas de Osvaldo Aranha, por exemplo, em que o corpo diplomata brasileiro era respeitado a ponto de que o próprio Aranha presidisse a Assembléia da ONU que votou a partilha da Palestina e a formação de Israel. Ou mesmo recentemente, quando Sérgio Vieira de Mello, fatidicamente morto em um atentado a bomba, era figura forte o suficiente para ser cotado para ocupar o mais alto cargo da ONU.

A diplomacia brasileira já fez muito bonito defendendo a postura de neutralidade que é típica do nosso povo, povo este que não confunde o ser-se neutro com a covardia, como outros povos mais bélicos e menos diplomatas teimam em enxergar.

Devido a estes homens o Brasil conquistou respeito internacional sendo visto como referência regional em mediação de conflitos ajudando a arbitrar sobre questões de diversos de nossos vizinhos – mas sempre deixando que eles encontrassem o próprio caminho.

Aí, vem o Lula.

Para nossos diplomatas de carreira a frase acima deve soar como maldição. Eles certamente se persignam escondidinho – que diplomata não anda assim falando aos quatro ventos determinadas coisas (por mais que as pensem).

Na era Lula, além da perda de parte do prestígio internacional longamente batalhado pelo corpo diplomático brasileiro, perdemos ainda uma cadeira na ONU, refinarias de petróleo para a Bolívia, pagamos mais caro pela eletricidade ao Paraguai (que só fornece a água – e nós construímos praticamente toda a usina que produz a tal eletricidade cara) e perigamos várias vezes perder a ascendência regional para o Hugo Chávez.

Perder para o Chávez é brincadeira! É pior que perder para Argentino: é o mesmo que equiparar a diplomacia brasileira a um circo chinfrim de interior – daqueles que o mesmo artista faz todos os números perdendo 5kg por apresentação de tanto correr pra trocar de roupa!

Para completar temos Honduras e seu presidente deposto que se assentou qual rei-abacaxi com chapéu de cowboy, com toda sua corte, em nossa embaixada na capital daquele país.

O presidente interino – golpista – decreta estado de sítio, fecha o país, fecha meios de comunicação de oposição e... Cerca nossa embaixada, proíbe o acesso de brasileiros a ela, corta água, luz e provisões (voltou atrás depois, mas o fez) e ameaça expulsar nossos diplomatas de lá.

Resumindo: está falando grosso – o presidente golpista de um país que temos que consultar o Atlas para saber onde fica dada a sua relevância internacional – e o Brasil?

Continua falando manso, como quando Morales estatizou nossas refinarias.

Ai, que vergonha.

E que saudades da verdadeira Diplomacia – aquela que defendia os interesses brasileiros com firmeza – e não condescendência excessiva com quem depena bens do país. Que era neutra – mas não covarde. Que construiu um nome e respeito para este país – nome e respeitos estes que vimos rebaixados a níveis venezuelanos recentemente.

Ai, que saudades de épocas menos embaraçosas. Espero apenas que ainda haja aqueles, diplomatas de carreira que não rezem pela cartilha falida de esquerda, escondidinhos em algum quartinho do Itamarati, esperando apenas que a era de frutos do mar passe para vir à tona e limpar a caca deixada para trás por esta pseudo-diplomacia que botou um nariz de palhaço na imagem do Brasil no exterior.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

OI, pessoal! Essa semanafiquei devendo o texto porque fiquei de cama com gripe: seja suína, ovina, bovina - o que sei é que fiquei muito mal. Mas, já estou melhorando.

Vim justificar e já estou voltando para a cama!

Aguardem o texto para semana que vem... Beijo!

terça-feira, 15 de setembro de 2009

O Bullying e a falta de empatia

Outro dia, em sala de aula, aconteceu um fato que chamou a minha atenção para um assunto muito comentado recentemente: o “bullying”. Para quem não sabe, este é um termo em inglês que, fazendo referência ao "bully" (valentão) e seu comportamento agressivo, designa alunos que, demonstrando o mesmo tipo de atitudes, intimida e agride – verbal ou fisicamente – os seus colegas de escola.

O acontecido foi o seguinte: em uma das minhas turmas há um menino, obeso e bem alto – extremamente simpático e educado, o qual chamarei de Marco – que vivia, ao contrário do esperado, xingando seus colegas, interrompendo as aulas. Várias vezes, chamei-lhe a atenção. Ele sempre se desculpava e calava-se.

Isto sempre me intrigava, já que tal comportamento parecia díspar em relação à sua personalidade – mas ele jamais comentou absolutamente nada.

Lá pela terceira aula em que isto aconteceu, uma pessoa, outro aluno, amigo dele, procurou-me fora da sala, em particular. Disse-me que o tal aluno apenas estourava porque os demais o irritavam a ponto dele explodir, fazendo piadinhas com relação ao seu peso e tudo o mais que eles pudessem mencionar de maneira pejorativa. Disse-me ainda que eles o faziam de propósito, em todas as aulas, e que ele, mesmo tentando, não conseguia conter-se.

Agradeci a este aluno, pela atenção com o colega e pela confiança e pus-me a refletir sobre como poderia solucionar esta questão.

Logo percebi que, a primeira hipótese a surgir ao se pensar na situação é que Marco reagia infantilmente. Que era inocente ao não perceber que seus colegas zombavam dele apenas porque sabiam que ele iria acabar esbravejando e sendo repreendido pelo professor presente em sala.

Mas, o que pensei imediatamente após elaborar esta primeira teoria foi que é muito simples julga-lo “o inocente” e “o despreparado” transformando-o de vítima em culpado. Seria o mesmo que dizer que a mulher violentada carrega qualquer culpa pela violência sofrida por, por exemplo, usar roupas curtas, eximindo, mesmo que parcialmente, o autor da violência de culpa – como se o violentador fosse um animal guiado pelo instinto e não um humano dotado de raciocínio.

Alguns dirão que a comparação é exagerada. Bem, discordo. Obviamente, que as marcas traumáticas causadas por uma violação sexual – sejam elas físicas ou psicológicas - serão duradouras, sendo que das segundas, pode ser que a vítima jamais se recupere.

Entretanto, quando se fala de violência moral, de agressões verbais, também se fala de algo que deixa marcas perenes: especialmente quando os envolvidos estão em plena fase de desenvolvimento, ainda terminando de moldar a forma como encaram a si mesmos e ao mundo.

Isto significa que, para Marco, não existiam marcas físicas a exibir para comprovar a violação, mas as marcas internas causadas por repetidos abusos morais, bem, estas, apenas ele poderia dizer o quanto doíam ou incomodavam – e não cabe a mim ou a qualquer outra pessoa classificá-las de infantilidade ou exagero.

Cheguei a esta conclusão pensando na empatia, sentimento este que sempre procuro enfatizar por tornar as relações sociais mais amenas e mais fáceis. E foi ainda em cima da empatia que embasei toda a minha argumentação para conversar com a sala.

Assim, na aula seguinte, comecei com uma prosa. Iniciei dizendo que sempre me perguntava por que Marco parecia tão impaciente às vezes e, ao mesmo tempo, não se queixava de nada. Disse ainda, que, um aluno da sala, se sentindo condoído pelo colega, havia me procurado e, sem mencionar nomes e nem ser específico, havia me dito das brincadeiras que irritavam tanto o rapaz em questão.

Eles tiveram a reação esperada: começaram dizendo que se tratavam de brincadeiras inocentes, não feitas com o objetivo de ofender ou intimidar. A princípio, concordei com eles: “Puxa, realmente é uma infantilidade se ofender assim, né?...” Dei bastante espaço para eles se pronunciarem, justificando-se. Aí, sapequei a pergunta: “Mas, e se essas “brincadeiras” fossem feitas com seu irmão, sua mãe ou com você? Como você se sentiria no direito de reagir? Ainda assim, as consideraria inofensivas?”

Tudo bem que eu aprendi isto com Samuel e o Rei Davi, no caso das ovelhas (metáfora para uma mulher casada, a qual o soberano havia usado de sua influência para conquistar), lá no velho testamento. Segundo a argumentação ali, conta-se o caso e inverte-se a situação para que a pessoa possa colocar-se no lugar da ofendida, percebendo seu erro.

Como no velho testamento, funcionou perfeitamente. Toda a argumentação em defesa dos “brincalhões”, que na verdade praticavam uma das formas de bullying, caiu por terra e eles comprometeram-se a não repetir as tais brincadeiras.

Marco, a princípio, sentiu-se um pouco intimidado quando comecei a falar, especialmente quando parecia que eu também achava as brincadeiras inofensivas. Entretanto, sua expressão de alívio fez valer a pena toda a conversa e vinte minutos de aula gastos levando a galerinha a raciocinar e a repensar suas atitudes. Ainda, me desculpei com ele por não tê-lo procurado antes para saber se havia algo de errado.

Ele, por sua vez, conversou comigo depois da aula para me agradecer por tê-los feitos ver os acontecimentos na pele dele, em seu lugar.

É claro, que ao final de minha fala, deixei bem claro que não admitiria a repetição de tal comportamento: nem contra Marco ou qualquer outro – e eles entenderam bem o recado, já que, mesmo depois de algumas semanas, não vi este tipo de episódio repetir-se.

Porém, posso dizer, que minha reflexão sobre estes acontecimentos ainda permanece. É interessante perceber como que, se perguntados, todos são contra o bullying em todas as suas formas. Mas, ao mesmo tempo, são incapazes de perceber que algumas de suas práticas estão intrinsecamente ligadas a ele: não é preciso bater em alguém ou tomar seu lanche, ou trancá-lo no armário – como se vê em filmes americanos - para que se seja praticante deste comportamento deplorável.

É o mesmo que dizer que para se ser classificado como racista, precisa-se, frontalmente, agredir a alguém de cor diferente da nossa. Que as piadinhas ou “brincadeirinhas” vexatórias ‘não têm nada a ver’.

Para se ser um “bully” ou um preconceituoso, basta que se use de qualquer forma de violência para agredir ao colega. Não importa se esta é verbal ou física.

Mesmo pensando semanas seguidas sobre este assunto, é interessante perceber como sempre chego à mesma conclusão: tudo seria bem mais simples se todos se utilizassem da empatia - ficaria bem mais fácil julgar o que é ou não ofensivo ao nos colocarmos no lugar do outro.

(Tudo bem! Sei que empatia rima com utopia, mas não custa tentar... Alguém ainda vai me ouvir, como espero que aqueles meus aluninhos tenham me ouvido. Como disse, não custa tentar ).

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Heavy Fest 2009 - Impressões e Digressões

Sábado, dia 05/09/2009, aconteceu em Conselheiro Lafaiete-MG, na Confraria, o Heavy Fest, em sua 5ª edição. Este evento é organizado por Anderson Sabazinho que, mesmo não tendo a produção de eventos como sua atividade principal, dedica-se anualmente à produção de, pelo menos, um festival voltado para o público Metal.

Os eventos deste apaixonado pelo metal pretendem sempre abranger várias vertentes do estilo, em especial o Thrash, o Death e o Heavy.

No último Heavy Fest, não foi diferente. Seis bandas foram convidadas para participar do evento: Sflexia (Crossover), Sacrament (Heavy e Thrash), Hammurabi (Death Metal), Excaliburn (Melodic Death Metal), Mercuryio (Heavy Metal) e a minha banda: Achilles (Heavy Metal).

O público Metal, como sempre, raivoso na aparência, pacífico e de fácil manejo no procedimento, como o próprio pessoal da casa de shows pôde ressaltar – era a primeira vez que eles alugavam o espaço para um evento da nossa galera e mostraram-se surpresos com o pessoal que, segundo palavras deles, queria apenas curtir o som das bandas, agitar e beber.

Ou seja, nada de confusão e quebra-quebra, como muitas vezes se vê em outros tipos de eventos, para outros tipos de público. Por isso, o pessoal da Confraria mostrou-se, ainda, inclinado e aberto à produção de novos eventos voltados para o nosso público.

Este comentário, para mim, foi um dos pontos altos da noite. Veio corroborar o que venho afirmando há anos: o preconceito atinge em cheio a galera do Metal que se vê estereotipada, encaixada em uma fama que não lhe faz justiça. E para aqueles que, mesmo tomando conhecimento deste tipo de comentário e que, ainda assim, pensa que isto é um fato isolado, convido a ler a reportagem da Veja sobre o assunto, na qual este veículo absolutamente respeitado, afirma que os headbangers apesar das “caras de maus” são pacíficos.

Quanto a mim, mesmo que vá a um evento com o objetivo de tocar, considero de bom tom assistir aos shows apresentados – afinal, o movimento é feito para nós e merece nossa audiência. Desta forma, assisti a todos os shows, exceto o logo anterior ao da minha banda, o Hammurabi – o qual apenas ouvi do camarim - já que usamos esse tempo para reunir instrumentos e aquecer vozes e dedos e nos preparar para defender com honra a bandeira do Heavy Metal.

Uma surpresa extremamente positiva para mim foi o show do Sflexia. Já havia estado presente a algumas apresentações desta banda lafaietense que faz som Crossover e, desta vez, percebi uma evolução grande dos meninos em relação à qualidade do som que se apresentou pesado, bem trabalhado e com letras fortes e altamente críticas. Posso dizer que curti bastante a apresentação deles.

A galera do Thrash e do Death também mandou muito bem, de uma maneira geral. E, é sempre bom destacar, o pessoal tem se preocupado muito em produzir seu próprio som: quase todas as bandas levaram CDs com músicas próprias, os quais puderam vender para a galera presente.

Infelizmente, quando procurei alguns para comprar, uma parte das bandas já havia ido embora com suas respectivas excursões. Quero crer que havia motivos justos para tanto, já que é de bom tom que se assistam aos outros shows e que, especialmente, não se leve embora parte do público, colaborando assim para que as outras bandas também possam fazer apresentações prestigiadas pela galera, com um público em número representativo.

O excelente foi que, apesar de que a Banda Achilles, da qual sou vocalista, ser a quinta da noite – o que significa que começamos a tocar próximo das duas da manhã - tivemos um público envolvido, presente e que nos deixou extremamente satisfeitos. Durante o festival, apresentamos apenas covers. Escolhemos medalhões – músicas já conhecidas e respeitadas, de bandas que colaboraram com a criação do Heavy Metal como o conhecemos hoje. Maiores esclarecimentos sobre a origem deste estilo de som podem ser encontrados no texto “Denim and Leather: sobre a origem do Metal”, aqui mesmo neste blog.

Desta forma, visitamos o trabalho da tríade fundadora do Metal – Deep Purple, Led Zeppelin e Black Sabbath – além de também tocarmos Iron Maiden, AC/DC e Helloween.

Para nós foi realmente emocionante ver a reação do público que bateu cabeça com vontade e interagiu conosco o show inteiro. É sempre interessante para mim, em particular, perceber como músicas que têm 30, 40 anos ainda comovem a galera metal. Como já mencionado em texto anterior, o balançar dos cabelos é uma louvação por parte do banger. Assim, sentimo-nos bastante elogiados ao ver pessoas com camisas de bandas de estilos completamente diferentes do nosso – como Slayer, Krisium, Behemoth, Death – agitando, na primeira fila, com nosso som, no qual reproduzimos, respeitosamente, o som das bandas que curtimos. A camisa que levamos para dar de brinde, por exemplo, foi presenteada para um banger, com a camisa do Slayer, que agitou o show inteiro.

Mais uma vez, é claro, ressalto a qualidade dos músicos que tocam na Achilles, os quais admiro profundamente. São eles: Nilson Lima e Ícaro Honori, guitarristas que primam pela excelência, ambos solistas de qualidade; Mário Henrique, baixista que, apesar do relativamente pouco tempo com o instrumento, tem conseguido desenvolver um estilo próprio e, é claro, Sandinho, de quem eu poderia ser considerada suspeita para falar devido ao nosso casamento de mais de década. Porém, posso dizer que relacionamento amoroso não tem nada a ver com música e que, por ser ele quem é e o que representa para mim, isto o torna ainda mais visado para os meus ouvidos que não se decepcionam ao ouvi-lo tocar.

É claro também, que hoje, considero impossível considerar a banda Achilles como sendo composta por apenas nós cinco. Contamos com o apoio impagável da Bárbara Dutra, namorada do Ícaro que, além de curtir nosso som, está sempre conosco, auxiliando e correndo atrás de absolutamente tudo o que se mostrar necessário. Assim, podemos, em nosso pouco tempo - todos trabalhamos em outras áreas: a música é nosso hobby – nos preocupar exclusivamente em tirar música, fazer música porque ela cuida, com muito boa-vontade, de todo o restante.

Assim, com essa galera de qualidade, levamos nosso som para o Heavy Fest V e, posso afirmar, que não nos decepcionamos. O Sabazinho, amigo de anos, nos deu toda a assistência necessária. O Régis colaborou bastante com o som, que foi bem definido – não adianta nada os guitarristas estarem destrinchando solos complexos se ninguém consegue ouvi-los, ou se os instrumentos embolam.

E o público, bem, este nos causou grande emoção ao cantar conosco jogando seus cabelos, batendo cabeça, pedindo bis e gritando nosso nome no final. Foi absolutamente emocionante. Além disto, é sempre bom destacar o espírito de cooperação que impera neste tipo de eventos: quando o Sandinho teve problemas na bateria, contou com o apoio do Crislei, parte do público presente e também integrante da Hammurabi, que, até mesmo se prontificou a emprestar parte do seu equipamento, se necessário.

No mais, um grande beijo a todos e até o próximo evento, porque tocando ou não, certamente estaremos lá, do começo ao fim, prestigiando o Movimento Metal, do qual, orgulhosamente, fazemos parte.

Aqui, uma pequena amostra dos covers que a Banda Achilles apresentou. Hail Metal!!!

"Back in Black"


"Smoke on the Water"


"The Trooper"

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

PRECONCEITO SE APRENDE EM CASA, NA ESCOLA...

Semana passada, ainda no jornal da manhã, vi um fato, acontecido no estacionamento do Carrefour (São Paulo), que, mais uma vez, me fez refletir sobre a questão da discriminação de cor que existe no Brasil.

Preconceito de cor, sim. Recuso-me a usar a palavra raça – já que creio que todos nós, homo sapiens, mesmo que de origens e etnias diferentes, pertençamos à mesma raça: a humana e, como tais, somos detentores dos mesmos direitos e obrigações.

É claro que, sempre existirão aqueles que, em prol de defender seus conceitos e vantagens, sob forma de indenização procrastinada sobre males históricos, defenderão o conceito de raça negra, raça branca, raça amarela, raça indígena, raça dominante, raça subjugada, etc., tentando separar aqueles que são sofredores ou não, injustiçados ou não. Como se, em um país multicolor como o Brasil, fosse possível separar aqueles que descendem de tal ou tal etnia pela sua aparência, ou pela aparência de seus descendentes.

Mas, o fato reportado no jornal foi o seguinte: seguranças do mencionado supermercado espancarem um cidadão, da cor preta, no estacionamento, por concluírem que o mesmo estava roubando seu próprio carro.

Eu, ainda deitada e cochilando, imediatamente despertei e comecei a prestar atenção. Assuntos assim me interessam sobremaneira já que, como pertenço, pelo lado materno, a uma família de negros, (evocando conceitos de raça segundo preferem alguns, em vez da terminologia oficial pretos, que se refere somente à cor da pele), cheguei a presenciar o preconceito em diversas ocasiões.

A primeira de todas, e a que considero mais relevante, por ter me feito refletir, tendo acontecido há muitos anos, eu ainda menina. Meu pai havia comprado uma cota em um clube, no bairro Serra Verde, próximo à casa de minha avó Hilda, a mãe de minha mãe. Ele procurou saber quais os procedimentos que seriam necessários para que levássemos dois convidados – minha avó e minha tia, que era da minha idade.

Todas as exigências cumpridas, seguimos todos para o clube – meus pais, minha irmã e eu, além de minha avó e minha tia.

Ao parar na portaria, meu pai foi discretamente chamado para a gerência, enquanto aguardávamos do lado de fora, antes da cancela. Ele demorou-se alguns minutos e depois saiu, de cara séria e levou-nos embora.

Ficamos todos sem entender, já que ele não mencionou o que haveria acontecido.

Seguimos para a casa da vovó e lá, eles nos mandaram – éramos crianças – brincar no quarto, enquanto discutiam algo na sala. Obviamente, que curiosa como eu estava, dei um jeito de ficar ouvindo o que falavam, sem ser percebida. Sei que isto é horrível, mas vai explicar isto para uma criança de cerca de 8 anos cujo passeio ao clube fora frustrado sem explicações!

Ouvi meu pai, que não é caucasiano, mas é considerado branco para os padrões brasileiros, explicar à minha mãe e minha avó que a entrada dela e de minha tia havia sido barrada devido à cor da pele delas – eram pretas.

Sinceramente falando, eu jamais havia me dado conta disto: minha avó, minha tia, meus dois tios - irmãos de minha mãe - meus tios-avôs e tias-avós - irmãos de minha avó - e todos os meus primos eram pretos; alguns mais claros, como a Camila Pitanga, outros mais escuros, como o Grande Otelo, mas todos pretos.

Eu jamais percebera, ao longo da minha vidinha de 8 anos, de que havia algo de diferente entre esta parte da minha família e a outra, do meu pai, que era branca (obviamente que para os padrões brasileiros, o qual difere das definições utilizadas mundo afora para caucasiano).

Sendo assim, do mesmo jeito que eu gostava da minha avó que acabara de descobrir que era preta – e ainda amo - eu gostava da minha avó branca, a Luíza, que já faleceu há alguns anos. Amava e respeitava aos meus tios e tias da mesma maneira, brincava com todos os primos do mesmo jeito – nem eu, nem minha irmã, fomos ensinadas a ver ou fazer diferença entre as pessoas devido à cor de sua pele. Fomos ensinadas a amar e respeitar aos nossos e aos outros - e ponto final.

A questão da cor da pele jamais havia sido discutida ou mencionada como sendo algo que fizesse parte de qualquer decisão que tivéssemos que tomar ou de qualquer sentimento que fôssemos desenvolver por alguém.

Tanto foi assim que, apenas naquele momento, eu percebi que aquele “negócio” de pretos e brancos, do qual eu ouvira falar na escola, referia-se também à minha família e, consequentemente, a mim – que apesar de ter uma cor classificada como branca por muitos, não sou caucasiana.

E posso dizer que fiquei com raiva. Muita raiva. Raiva das pessoas que haviam impedido o nosso passeio por fazerem uma diferença entre seres-humanos, diferença esta que, em minha sabedoria infantil, eu sabia que não havia. Raiva por ter visto minha avó receber a notícia com tristeza e abatimento.

O sentimento foi tão forte que, até hoje, quando falo do assunto, sinto a mesma efervescência interna – raiva como apenas as crianças são capazes de sentir.

Desde então, tudo que se refere ao preconceito de cor, considero ser de meu interesse: acompanho bem de perto. E continuo a me chocar com a forma com que as pessoas tratam seus iguais.

Daquele momento em diante, comecei a observar como este mal social está enraizado em nossa sociedade – onde se dizer que se é preconceituoso é ofensivo e inaceitável. É crime passível de prisão, inclusive.

Mas, onde também se contam piadas que envolvem pessoas pretas, em situações vexatórias, e se ri delas sem a menor cerimônia. Onde pessoas que fazem a segurança de um local público sentem-se no direito de espancar outra porque um carro, pago à custa de muito trabalho, não pode pertencer a alguém preto e de aparência simples.

Observei também, ao longo de meus anos como aluna, a maneira pela qual, apesar de pertencer a um país onde a mistura de etnias e cores é a regra histórica e não a exceção, a nossa história é branca. É o que se vê nos nossos livros.

Em épocas em que a internet não existia e a fonte maior de pesquisa era a Barsa, interpelei meus professores diversas vezes quanto a se não havia pretos que participaram ativamente da construção de nosso país, de nossa história. A resposta era sempre a mesma: “Claro que sim: Zumbi e Xica da Silva”. Mas só eles? - era o que eu me perguntava.

A medida em que fui crescendo, a temática do preconceito começou a ser mais discutida socialmente e a informação tornou-se menos difícil, comecei a procurar por mim mesma as minhas respostas. Qual não foi minha surpresa ao descobrir que alguns de nossos nomes da literatura eram mulatos. Nomes de peso como o de Machado de Assis.

Descobri ainda, mencionando apenas algumas figuras, pessoas relevantes como Luiz Gonzaga Pinto da Gama, João Cândido Felisberto, Abdias do Nascimento. O primeiro, jurista e jornalista que, em épocas de escravidão, utilizava-se de meios legais para garantir a liberdade de escravos. O segundo, em épocas em que legalmente a escravidão já era extinta, lutou contra os castigos corporais na Marinha brasileira na chamada de Revolta da Chibata. Já Abdias é um nome influente na atualidade defendendo o respeito ao povo preto, negro como ele prefere, e a sua inclusão social através de políticas de proteção, como as cotas em universidades.

Segundo meus argumentos já devem ter deixado claro, sou contra as tais cotas oferecidas àqueles de determinada cor – já que, meramente a cor não faz com que o indivíduo seja necessitado de auxílio ou seja incapaz de conseguir sucesso por méritos próprios. Defendo, antes, que a proteção do Estado seja dada a todos os que dela necessitam por encontrarem-se em desvantagem social – ou seja, a todos os pobres, independentemente de sua cor ou ascendência. Mas, porque discordo de pontos defendidos por aquele poeta, ator e ativista, não quer dizer que ele não exista!

Desta forma, hoje, como adulta, tendo refletido muito sobre aquele primeiro acontecimento de preconceito que eu presenciei, me informar e ler, posso entender que preconceito, não se nasce com ele – se aprende, ou não. Em minha família, por exemplo, não o aprendemos.

Porém, a temeridade que percebo é que, mesmo não tendo aprendido o preconceito em casa, eu também poderia tê-lo aprendido na escola ou no convívio com outros.

Na escola, sim, pois como explicar o fato de que inexistem nos livros personagens relevantes advindos das principais etnias – branca, preta ou indígena? Fica implícita, a meu ver, a conclusão de que pretos e indígenas não colaboraram historicamente por incapacidade. De que outra forma sua ausência poderia ser entendida por aqueles que não se deram ao trabalho de pesquisar e saber que eles existiram e que estão meramente omitidos ou citados de passagem?

Sendo assim, entendo como sendo não apenas meu dever, como educadora, mas o de toda uma sociedade ensinar a seus filhos que discriminação de qualquer espécie – cor, sexo, religião, orientação sexual, posição social – é vergonhosa e criminosa.

E que, principalmente em nosso país, não somos nem pretos, nem brancos, nem amarelos, nem indígenas – somos todos brasileiros, descendentes diretos ou indiretos de várias etnias e que, por isso, devemos aceitar e respeitar a todas, já que todas compõem a nossa ascendência e a nossa história. Em nosso DNA estão presentes tanto os violinos europeus quanto os tambores africanos e ameríndios.

Apenas com esta compreensão teremos, enfim, a consciência de povo, enquanto nação brasileira, orgulhosamente multicolor.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Sádico, violento e odioso

Publicado na 102ª edição do jornal "Conhece-te a ti mesmo".

Este mês prosearemos sobre uma das obras de Donatien Alphonse François, o Marquês de Sade – ele mesmo: aquele que deu origem ao nome Sadismo que se refere a um transtorno de ordem sexual.

Quando se lê Os 120 dias de Sodoma entende-se exatamente porque o nome de seu autor foi usado para nomear esta perversão: este livro é a epítome do horror sexual.

Na introdução do livro, após uma pequena contextualização histórica onde Sade explicita a situação da França à época de Luis XIV – tesouro e povo exauridos – somos apresentados às protagonistas: figuras poderosas, influentes e muito ricas estando acima de qualquer possibilidade de justiça – o que é primordial tendo em vista os acontecimentos que se desenrolarão ao longo do enredo. São eles: o Duque de Blangis e seu irmão o Bispo de X (que, por questões de verossimilhança tem seu nome ocultado), Durcet e o PRESIDENT Curval.

Estes homens, já de início, nos são mostrados como amorais e como tendo experimentado todos os vícios possíveis a milionários de desejos incomuns. Para que se tenha uma idéia da percepção alterada destes homens, eles combinam casarem-se, cada qual com a filha do outro – cada pai deixando bem claro já ter cometido incesto com suas respectivas filhas. E mais, o desejo explicitamente revelado de cada um deles é: ao casar-se com a filha do amigo e comparsa para fazer dela uma escrava que execute todos os seus desejos e desígnios, já que, como esposas, as moças estariam presas a laços sociais e legais que protegiam maridos em detrimento de seus cônjuges. Ainda, segundo acordo mantido entre eles, cada pai continuaria tendo acesso sexual a sua filha, já que eles fariam um rodízio de esposas.
Além delas, em suas orgias, não havia limite mínimo ou máximo de idade, classe social, sexo ou situação.

Resumidamente, não possuíam preferência, exceto o excesso.

Ainda no começo do livro, cansados de Paris, arquitetam um plano macabro segundo o qual ficariam enclausurados em um castelo com pessoas escolhidas e, em sua maioria, seqüestradas por seus asseclas. Dentre estes, há quatro idosas, oito homens (cuja exigência é que tivessem um membro de tamanho descomunal), quatro prostituas experientes que contariam histórias vividas por elas, oito meninos, oito meninas e as quatro esposas. Contando com os funcionários e as quatro personagens principais, estariam no castelo quarenta e seis pessoas.

É interessante dizer que destes, ao final dos cento e vinte dias de orgia, depravação e torturas, apenas dezesseis, contando com os quatro protagonistas, sobreviveriam para voltar à Paris.

Ao longo destes dias no castelo, Sade expõe toda a sua maestria em dominar a expressão ao descrever em pormenores os corpos e acontecimentos: ora tem-se a imagem angelical – quando, por exemplo, ele descreve Augustine, uma das adolescentes sequestradas – ora tem-se imagens degradadas e que causam asco (por falta de palavra mais forte) – como quando ele descreve Curval e o seu ânus.

Porém, ao chegar aos capítulos finais, Sade muda radicalmente a forma do livro: deixa de descrever em detalhes as situações passando a contar as torturas sob forma de apontamentos. Ao lê-los, tive a impressão que ou ele não conseguiu concluir seu manuscrito da forma como desejaria deixando de expandir as idéias, ou ele mesmo cansou-se de tanta vilania.

Ao longo do livro, o autor promove uma inversão de valores morais, éticos e religiosos, pois, ao passo que descreve os crimes desprezíveis que suas personagens cometem para satisfazer desejos sexuais - incesto, pedofilia, COPOFAGIA, estupro, tortura, assassinato – ele os classifica como “nossos heróis” dando, até mesmo, uma aura de comicidade a determinados eventos chocantes.

Também questiona a aparente inépcia de Deus e da Igreja em cuidar de questões terrenas, já que Constance, uma das esposas e muito temente a Deus, é insistentemente torturada e confrontada com a falta de ação deste Deus a quem ela tanto adora e recorre. Isto é reforçado pela presença do Bispo que promove casamentos homossexuais em uma espécie de pantomima onde os mestres casam-se com meninos travestidos; ou vestidos com roupas femininas casam-se com homens. O próprio Bispo é homossexual: quando passivo gosta de homens másculos e bem dotados. Quando ativo, prefere menininhos – o que nos remete a problemas tão atuais quanto a pedofilia no âmbito da Igreja Católica.

Observa-se ainda que, à maneira medieval, Sade usa seus personagens como referência à classe de pessoas, não indivíduos, sempre grafando com letras maiúsculas suas funções e usando-as mais que os nomes próprios dos mesmos. Este recurso foi largamente utilizado por Gil Vicente em seu teatro, por exemplo.
Sendo assim, têm-se ali os estereótipos do político (Curval), do religioso (Bispo), do bon-vivant (Durcet) e do aristocrata (Duque). Todos corruptos, cruéis e milionários.

Deve-se ainda lembrar que, ao escrever este livro considerado sua obra-prima, Sade estava encarcerado na Bastilha. Ele constituía um embaraço para os altos círculos políticos, religiosos e sociais da França com seus escritos e comportamento devasso. Porém era admirado e lido pelo “povo”, como continua sendo até hoje. Na França, estuda-se Sade no ensino médio.

Estando, pois, na prisão política mais famosa da França, impedido de comunicar-se, restava-lhe o poder de sua pena. Desta forma, ao levar sua imaginação ao auge do horror sexual, era como se ele afirmasse: “Podes encarcerar-me, mas minha mente é livre. Sendo livre, choco-vos o quanto quero.”

Quando da quebra da Bastilha, este manuscrito foi esquecido, tendo sido publicado apenas em 1935.

Devido ao seu conteúdo absolutamente perverso, ele já foi até mesmo difícil de ser encontrado em português. Anos atrás, quando adquiri o meu tive de importá-lo em inglês. Atualmente, é possível encontrar edições com facilidade em nossa língua.
Confesso que o li apenas uma vez, tendo comprado por absoluta curiosidade – sempre gostei de ler Sade me divertindo com sua mente perversa.

Apesar de sua estética e tessitura textual absolutamente talentosa, Os 120 dias de Sodoma possui passagens que pesam, de fato, o coração de alguém fruto da sociedade moderna ocidental – como a descrição pormenorizada dos estupros das crianças e adolescentes, das fantasias escatológicas e/ou assassinas. Ao terminar a leitura do meu exemplar, o escondi no fundo de uma gaveta – a simples visão dele me angustiava, tais os horrores descritos.

Porém, sempre lembro àqueles que o leram e mostram-se chocados, que é importante notar que Sade apenas imaginou as perversões ali descritas. De acordo com o conhecimento que possuímos de sua vida, o sadismo não era levado por ele aos extremos do livro.

Entretanto, o que realmente me atemoriza é o conhecimento de que, ao passo que existiu alguém capaz de imaginar, existirá sempre alguém capaz de executar. Basta ler os noticiários e ver que tenho razão.
O
bviamente, esta não é uma obra que eu recomendo àqueles que possuam entes queridos desaparecidos, mas, certamente, é um livro interessantíssimo para aqueles que se perguntam até onde a mente humana é capaz de chegar.

Mas apenas se aventure se você possuir estômago para tanto.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Gripe Suína em Conselheiro Lafaiete

É interessante a forma como os meios de comunicação em massa de Lafaiete não divulgam informações sobre a Gripe A na cidade. Durante algum tempo, teve-se, devido a isto, a impressão de que vivia-se em um oásis em que a doença não havia ainda chegado.

Entretanto, conversando com pessoas que possuem informações privilegiadas por terem conexão - direta ou indireta - com os maiores hospitais da Cidade, qual não foi minha surpresa ao ser informada de que há, inclusive óbitos devido a nova gripe em nosso município, enquanto que outras pessoas, infectadas, foram transferidas para outras cidades - Barbacena e Belo Horizonte - devido à falta de leitos nos hospitais da região.

E a população segue desinformada.

sábado, 15 de agosto de 2009

Estado Ateu ou Estado Laico: sobre a geléia geral feita destes conceitos

Esta semana saiu na edição do Correio da Cidade, um dos principais jornais da cidade de Conselheiro Lafaiete, comentário de um articulista referente ao pedido de liminar feito pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, do estado de São Paulo. Tal liminar determinaria que todas as imagens e símbolos religiosos em exposição em repartições públicas federais do país fossem retirados.

A opinião do referido articulista me surpreendeu – de acordo com o mesmo, a retirada de tais símbolos ofenderia a fé dos brasileiros, os quais se reconhecem como cristãos. Ele ainda parte para a acusação afirmando que este pedido só pode ter sido feito por pessoas que “temem” ao Deus cristão e aos seus olhos acusadores – já que os símbolos em exposição seriam, segundo o próprio colunista, representações que remetem ao Cristo e à fé inaugurada por ele.

Bem, a verdade é que esta coluna me deixou extremamente desapontada. E furiosa também: pretensão e preconceito travestidos de conhecimento ainda me surpreendem bastante.

Explico-me, como sempre – mas antes de explicar-me, reafirmo que, pessoalmente, não possuo absolutamente nada contra nenhum tipo de fé, seita ou religião (para evitar mal-entendidos). Desde, é claro, que a mesma defenda princípios fundamentais baseados no amor e respeito ao próximo – princípios estes que tornam a convivência social possível. Sendo assim, nem judeus, nem praticantes do umbanda ou do candomblé, nem muçulmanos ou quaisquer outros pertencentes às centenas de expressões de fé existentes e compreendidas no mundo, ou mais especificamente, dentro do território brasileiro, serão alvo de meu desrespeito ou preconceito.

Nem mesmo, no que depender de mim, terão de contemplar imagens que nada lhes dizem, em local de destaque e veneração em repartições públicas – repartições estas que são sustentadas pelos impostos pagos também por eles, não apenas pelos que são cristãos - é sempre conveniente lembrar.

Mas, raciocinemos como o colunista do Correio – apenas usando um princípio cristão, a chamada Regra de Ouro: o de não fazer aos outros o que não queremos nós mesmos sofrer, segundo defendido pelo Cristo. Assim, empaticamente, imaginemos a situação ao contrário: será que o mesmo articulista se sentiria confortável se, ao adentrar um local público – federal ou não – se deparasse com a imagem de Yemanjá ou de qualquer outra divindade cultuada nas inúmeras religiões e seitas existentes em nosso país? Ficaria ele, que se admitiu cristão, ofendido? Ficariam as pessoas que sustentam argumentação semelhante à dele ofendidas? Solicitariam que tal imagem fosse retirada? Reclamariam que este se trata de país cristão e, devido a isto, tal símbolo estaria alocado inapropriadamente?

Você, cristão, poderia, realmente, responder não às perguntas anteriores?

Desta forma, não estariam estas pessoas, ao afirmar que os símbolos da fé cristã devem continuar expostos, defendendo que pessoas de crenças diferentes não devem se ofender com uma situação que ofenderia a eles, cristãos? E o princípio da empatia na Regra de Ouro mencionada por Jesus? Vale apenas quando aplicada a nós e não aos outros?

Ora, pois o que me pergunto é se aqueles que argumentam contra a retirada de tais símbolos esquecem-se de que, se por um lado, o Brasil não é um país ateu – já que a maioria de seus habitantes possui pelo menos uma fé religiosa – não é também país de uma única fé, já que abriga crenças que vão desde as cristãs, passando pelas religiões de origem africana, muçulmana, judaica além das várias filosofias como o budismo, confucionismo e etc.

Ainda, quando digo “pelo menos uma fé religiosa”, há outra interpretação plausível, já que há aqueles que, à moda do Brasil – que é o país da mestiçagem - rezam na missa aos Domingos, estudam com os kardecistas às quartas e batem tambor às sextas-feiras crendo tanto no poder de Jesus quanto no de Oxalá ou dos espíritos iluminados - com a mesma intensidade.

E mais, mesmo entre os que defendem a fé cristã, há aqueles que negam veementemente o uso de qualquer imagem que represente o divino, como as Testemunhas de Jeová, já que esta é uma proibição expressa em trechos da Bíblia cristã que se repetem tanto no antigo, quanto no novo testamento.

O fato de que há uma imensidão de crenças, religiões e seitas em nosso território - além, é óbvio, daqueles que se professam ateus - e que os cidadãos que professam tais crenças têm que ser vistos com igual respeito pelo Estado escapa a todos os que defendem que a simbologia religiosa é bem-vinda em locais mantidos – já que são os cidadãos que pagam impostos – e freqüentados por pessoas que não compartilham das mesmas crenças.

Desta forma, uma opção, por questão de justiça é: se se defender que um ou outro símbolo de fé é bem-vindo, deve-se decidir que todos são – sem deixar nem mesmo o espaço reservado para aqueles que não possuem fé alguma. Imagine-se a babel de simbologias expostas que isto não geraria.

A outra opção é a proposta inteligentemente defendida pelos procuradores de São Paulo e que, certamente, soa menos confusa e exagerada do que a mencionada no parágrafo anterior: retirem-se os símbolos dos locais que pertencem a todos – já que é isto o que a palavra público quer dizer – e deixe-se a devoção para a casa dos indivíduos e que lá, cada qual mantenha seus locais de adoração da forma como achar apropriado. E que, possam estes professar sua fé e praticá-la, sendo todos eles respeitados de maneira igual pela nação.

Tal decisão não tornaria o Estado Ateu – sem Deus. Apenas reconheceria que a liberdade religiosa defendida pelo Estado Laico, neutro em questões religiosas, significa respeitar a decisão de cada indivíduo de servir àqueles deuses que considera merecedores de sua fé, e não privilegiar esta ou aquela divindade em locais públicos – já que os brasileiros não são 100% católicos, ou protestantes, ou judeus, ou ateus, ou o que quer que seja em termos de religião.
 
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