Já há alguns dias temos acompanhado os acontecimentos relacionados à presença de uma aluna trajando um vestido curto na Uniban, no campus de São Bernardo do Campo - SP. Na ocasião, ela foi seguida por uma turba, sendo ofendida e, finalmente, teve que ser escoltada pela polícia para fora da instituição.
Posteriormente, a universidade expulsou-a.
E teve a própria decisão revogada por seu reitor após repercussão negativa em todo o país.
A justificativa para a expulsão, a princípio, foi a argumentação de que a mencionada aluna já teria sido advertida de que deveria vestir-se apropriadamente, e que havia se negado a fazê-lo. Além disso, afirmou-se que no dia do tumulto, a aprendiz teria “desfilado” pelas dependências da faculdade, tomando um percurso maior que o usual, fazendo poses, para aqueles que quisessem tirar fotos, exibindo suas partes íntimas – conforme veiculação televisiva que reportava depoimentos de pessoas envolvidas com a universidade em questão.
Esse acontecimento me fez refletir bastante. Como se sabe, estou intimamente envolvida no ambiente educacional e prezo muitíssimo o espírito que deveria estar presente em todas as academias: o respeito ao conhecimento e ao desenvolvimento do mesmo, assim como à liberdade individual – pois, em ambientes em que se cerceiam a liberdade dos indivíduos, corre-se o risco de passar-se a cercear outros aspectos de sua liberdade. (Chame de trauma da ditadura, mas, é assim que realmente penso).
É justamente sobre essa tal liberdade individual que gostaria de discutir – a liberdade individual, aquela que nos permite apreciar, utilizar, ouvir, crer, argumentar, freqüentar, fazer – ou vestir – absolutamente tudo o que “vier na cabeça”. Em países democráticos, à exceção do que acontece em teocracias ou sob regimes totalitários, as pessoas são protegidas até mesmo pela lei, que preserva esse seu direito.
Assim, hipoteticamente, tendo como reserva apenas os limites morais (altamente subjetivos), habituais ou de formalidade – como, por exemplo, os trajes admitidos em fóruns, locais que restringem a vestimenta, impedindo o uso de roupas, não pelo seu cumprimento, mas pela sua solenidade – o cidadão brasileiro poderia trajar-se como bem entende.
Isso pode ser facilmente comprovado por uma observação simples em qualquer avenida de centros de cidades pelo país afora: a profusão de camisetas regatas, vestidos curtos, shorts de pouco mais de um palmo e meio, decotes, camisas de bandas (todos usados por homens e mulheres – inclusive os vestidos!).
Enfim, gente que se veste de acordo com meus padrões, com padrões diferentes dos que eu julgaria apropriados – mas, o que fica claro é que a minha opinião diz respeito apenas ao que eu visto. E nada mais.
Afinal, até onde me consta, não contribuo financeiramente para manter o guarda-roupas de ninguém – então, não tenho nada com isso!
Com relação ao ambiente escolar, em escolas de ensino médio, a vestimenta costuma ser limitada pelo Regimento Escolar – habitualmente, em nosso país, costuma-se exigir o uniforme.
Na academia, no ambiente universitário, porém, tais limitações, normalmente, inexistem. Os trajes não são, muitas vezes, sequer mencionados no Regimento.
Mesmo quando o são, são referidos através de conceitos vagos e absolutamente adaptáveis pela opinião individual como “de acordo com a moral”, “respeitando os costumes”.
Aqui, voltamos ao caso da Uniban. Para isso, convém acrescentar que não estou discutindo nem o caráter da moça, nem sua moral – os quais desconheço - ou qualquer coisa que os valha. Discuto, apenas, o acontecimento envolvendo sua minissaia e a turba de perseguidores.
Sejamos sinceros: algum de meus leitores, residente no Brasil, pode realmente afirmar que jamais tenha visto vestido, do comprimento usado pela aluna brasiliense, pelas ruas, bancos, lojas, bares, repartições públicas e, até mesmo universidades? Segundo o que eu mesma vejo dando um passeio pela cidade onde resido, posso afiançar que já vi até mais curtos!
Quanto à afirmação da direção da universidade de que ela tivesse exibido as partes íntimas em poses sensuais, e por isso havia sido expulsa, ora, efetuei busca rápida pela internet pelos vídeos ou possíveis fotos. Encontrei vários que mostravam a turba perseguindo a moça, mas absolutamente nenhum em que se pudesse vê-la mostrando nádegas, seios ou pélvis. Na maior parte deles ela aparece ora com raiva, ora com medo – mas sempre constrangida, e em alguns até mesmo chorando.
O fato de que as tais fotos não estejam na rede não soa estranho, especialmente considerando-se a profusão de celulares apontados para ela por inúmeras pessoas, participantes da turba ou meras expectadoras do acontecido?
E não queira o amigo afirmar que aqueles que teriam tirado as supostas fotos as teriam preservado para si, ou teriam evitado, por pudor ou medo, publicá-las na internet! Soaria absurdo considerando-se o contexto tecnológico, de informação e de exposição em que vivemos, agregado ao anonimato que a rede mundial de computadores provê.
Ainda me lembro quando eu mesma cursava faculdade, de uma de minhas colegas de classe absolutamente adepta das minissaias. Ela as usava em todos os estilos possíveis, todas as cores – mas o comprimento sempre o mesmo: curtinho mostrando suas pernocas. Tento imaginar nossos colegas formando um movimento, como o visto na Uniban, contra as sainhas da menina – e, sinceramente, por mais que eu tente, sempre me parece algo que não aconteceria dentro de uma academia de país democrático.
Especialmente do Brasil onde a exposição do corpo é o lugar comum – e não a exceção. Aqui, mulheres nuas vendem até pneus, já que seus corpos são exibidos em propagandas destes produtos. Se se falar de cerveja, então... Desta forma, fazer de uma minissaia motivo de notícia seria nada menos do que hipocrisia.
Bem me lembro que quando eu vi a primeira reportagem sobre o assunto, fiquei com a sensação de que algo estava faltando ao enredo, uma explicação mais racional para atitude tão irracional. Depois, conclui que aquela turba agia como sempre imaginei que acontecesse na caça às bruxas – alguém grita “Bruxa!”, a notícia corre de boca em boca crescendo em detalhes e eventos a cada repetição inexata e, a população em frenesi e histeria, persegue e apedreja a mulher.
Certo estava aquele que afirmou que a “massa é burra”.
O espantoso é que continue burra mesmo dentro da academia, onde o saber e o conhecimento deveriam imperar.
Se não imperam, que reine, pelo menos, o bom senso. E que atire o primeiro flash quem for hipócrita o suficiente.
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Há 13 anos
2 comentários:
Gostei muito do seu texto, e entendo que a Uniban perdeu a grande chance de aparecer na mídia de forma positiva, poderia ao mer ver ter reunido os alunos e debatido o evento, poderia ter dado show em educação, mas foi na minha modesta opinião, tão burra quanto a moça do vestido curto tem se mostrado, ao chegar ao cúmulo de por nas mãos de um cabelereiro a decisão sobre a sua saúde (entrevista na veja).
abraços
e FELIZ 2010 !
sei pouco sobre o caso por ter tido pouco interesse mesmo... da próxima vez que vir seu primo eduardo (meu irmão) saiba detalhes com ele, que era professor da menina na uniban , faculdade onde leciona até hj.
bjs e parabéns! a escrita ta cada vez mais bela...
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